As demandas setoriais constituem um desafio para a tramitação da regulamentação da reforma tributária no Congresso Nacional. Representantes de diversos setores da economia cobram do Senado Federal alterações no texto aprovado pela Câmara dos Deputados. Esta parte do projeto é responsável por definir isenções e reduções de alíquotas, bem como o novo Imposto Seletivo (IS), tributação extra destinada a itens considerados prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente.
O presidente Luiz Inácio Lula da Silva enviou ao Legislativo, na última sexta-feira, o pedido de retirada urgente do projeto de lei complementar que regulamenta a reforma tributária. O projeto bloqueava a agenda do Senado desde 23 de setembro e impediu até a votação da indicação de Gabriel Galípolo, diretor de Política Monetária do Banco Central, para a presidência da autoridade monetária.
Agora, a proposta deverá passar pela Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) antes de seguir para a Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania (CCJ), o que abre mais espaço para alterações no texto. Lideranças partidárias já sinalizaram que buscarão mudanças no assunto.
A retirada da urgência do texto era exigida por lideranças partidárias desde julho, quando o projeto foi aprovado na Câmara. O argumento é que a proposta precisa de tempo para ser discutida na Câmara. Ao Correio, o senador Izalci Lucas (PL-DF), coordenador do grupo de trabalho de regulação tributária no Senado, afirmou que foi uma “decisão acertada” e destacou que é preciso “analisar distorções” que passaram pelos deputados.
“Não faz sentido um projeto dessa magnitude tramitar com urgência, são mais de 1.300 emendas. A maioria dos senadores não consegue entender verdadeiramente o que vai ser votado e depende dos assessores”, afirmou. O parlamentar enviou requerimento para que a proposta seja avaliada pela CAE, antes de ter seu mérito analisado pela CCJ. “O encaminhamento pede apoio para que haja um debate oficial. O grupo de trabalho traz uma discussão mais informal, esse é mais um motivo para ele passar também pela CAE”, disse.
Esta semana, com a retomada das atividades presenciais após as eleições, a CAE já tem duas audiências marcadas para tratar do projeto, ambas sobre o impacto do novo Imposto Seletivo.
Entre as demandas setoriais estão a inclusão dos pequenos produtores rurais organizados em cooperativas como não-contribuintes, a inclusão do setor de assistência domiciliar em regime diferenciado, a isenção de impostos para o setor de previdência complementar e a adoção de um regime tributário único para todos. meios eletrônicos de pagamento, por exemplo.
Simples Nacional
Um dos pontos sensíveis da regulamentação da reforma tributária é como será o Simples Nacional. Há preocupação com o impacto das novas regras nas micro e pequenas empresas, que perderão competitividade com as mudanças que virão. Isso acontecerá porque esta categoria de empresas deixará de gerar créditos tributários.
O projeto permite que contribuintes do regime de tributação do Simples, com receita anual de até R$ 4,8 milhões, ou Microempreendedores Individuais (MEIs), optem por continuar no modelo antigo ou recolher a Contribuição sobre Bens e Serviços (CBS), e o Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), impostos introduzidos pelo novo regime com implicações federais e regionais, respectivamente.
Hoje, o sistema tributário desse segmento permite a geração de créditos tributários para quem revende produtos fabricados por microempresas. Isso significa que se uma pequena empresa pagar, supostamente, 10% de impostos, ela gera créditos fiscais de 10% para o comprador de seus produtos, que são usados para reduzir impostos devidos ao governo federal.
Com a reforma, as pequenas empresas deixarão de gerar crédito, perdendo uma moeda importante, enquanto as grandes empresas continuarão a gerar e permanecerão muito mais atrativas para os negócios. “Na prática, a redação (do texto) coloca o pequeno empresário entre a espada e a espada”, enfatizou o presidente da Confederação Nacional dos Dirigentes Lojistas (CNDL), José César da Costa.
Exceções cada vez mais caras
Especialistas alertam para o impacto do aumento do número de exceções no novo IVA (Imposto sobre o Valor Acrescentado), que irá unificar vários impostos. Recentemente, a equipe econômica anunciou que a alíquota geral deverá ficar próxima de 28%, justamente pelas exceções.
Numa nota técnica, ao analisar o atual regulamento da reforma fiscal, o Centro de Liderança Pública (CLP) concluiu que a criação de exceções e taxas diferenciadas para o IVA traz mais custos e prejuízos do que a determinação de uma taxa única. dados do Ministério das Finanças que apontaram que, entre os factores que deverão permitir que a tributação atinja este patamar, estão a inclusão da carne e do queijo na cesta básica, que passam a estar isentos de impostos, aumentando a taxa em 0,7 pontos percentuais ; e a redução das taxas de imposto para o setor imobiliário, que contribuiu para um aumento adicional de quase 0,3 pontos percentuais.
“As isenções ou taxas diferenciadas na taxa de IVA para sectores ou produtos específicos, além de complicarem o sistema fiscal, exigem uma taxa base mais elevada para compensar perdas de receitas. Algumas estimativas indicam que uma taxa única de IBS e CBS (ou seja, todos os produtos e setores que pagam o mesmo imposto) ficaria em torno de 22%, ou seja, 6 pontos percentuais abaixo da taxa base atual”, aponta o documento.
No que diz respeito à carne, em particular, a organização salienta que a isenção pode beneficiar desproporcionalmente os mais ricos. “As carnes, principalmente os cortes mais caros e os produtos de maior valor agregado, muitas vezes são consumidas em maior proporção por indivíduos de classes socioeconômicas mais elevadas. A isenção das taxas de consumo, portanto, pode beneficiar desproporcionalmente os mais ricos, que têm maior capacidade de consumo desses produtos”, disse, em nota, o CLP.
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