A penúltima reunião de 2024 do Comitê de Política Monetária (Copom), do Banco Central, acontece esta semana em meio a nova alta do dólar, que atingiu R$ 5,869 na sexta-feira —o segundo maior nível da história, perdendo apenas para maio de 2020 , R$ 5,90. Este novo patamar da moeda norte-americana também contribui para novas estimativas para as taxas de juros futuras e é um reflexo, segundo analistas, do aumento da incerteza em torno da credibilidade do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva no controle dos gastos públicos. Além disso, as eleições presidenciais nos Estados Unidos, com o aumento das apostas na vitória do republicano Donald Trump na votação de amanhã, ajudaram a aumentar o valor do dólar.
Com mais uma piora no ânimo do mercado, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva convocou o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, e o fez cancelar uma viagem à Europa esta semana. O chefe da equipa económica percorreria as principais capitais do velho continente: Paris, Londres, Berlim e Bruxelas. E, segundo nota do ministério, Lula pediu ao ministro que ficasse em Brasília para focar nas “questões domésticas”. Ao ser questionado ontem por jornalistas sobre o assunto, Lula se irritou e evitou falar sobre o pacote de corte de gastos.
Ajuste difícil
A viagem de Haddad não foi bem recebida pelo mercado, que aguarda esse pacote desde o segundo turno das eleições. A sinalização de Haddad de que não haveria data só fez o dólar subir ainda mais e alguns analistas não descartam que em breve a moeda norte-americana ultrapasse os R$ 6. “Foi um mau sinal do governo de que não há uma boa ideia sobre ajuste fiscal. Será difícil para o governo apresentar algo realmente relevante em termos de gastos”, disse Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. Para ele, apesar deste apelo do ministro pelo chefe do Executivo, só em 2027 será possível o governo fazer algo mais concreto em termos fiscais.
Para esta semana, as atenções do mercado estarão voltadas para o Copom, amanhã e quarta-feira (6), e para os dados de inflação de outubro que serão divulgados na sexta-feira (8). O consenso entre os analistas ouvidos pelo Correio é que o Copom acelerará o ciclo de aperto monetário, elevando a taxa básica da economia (Selic) em 0,50 ponto percentual, para 11,25% ao ano. Em setembro, quando os juros voltaram a subir, frente aos Estados Unidos, o Comitê elevou a Selic em 0,25 ponto percentual e não sinalizou quando poderia interromper o ciclo justamente pela piora nas estimativas do mercado para a inflação.
Um dólar mais forte e cada vez mais próximo de R$ 6 acaba gerando mais pressão para a inflação, cujas projeções do mercado para o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ultrapassaram o teto da meta, de 4,50%, e permanecem acima do centro, de 3%, até 2027 Especialistas já preveem um novo patamar para a Selic no final do ciclo de aperto monetário — que antes estava entre 12% e 12,50% ao ano. Agora, os mais pessimistas prevêem mesmo que a taxa básica poderá subir para algo entre 13% e 14% anualmente.
“O grande debate do Copom será sobre a extensão do ciclo de aperto monetário. O BC acelera o ritmo para 0,50 ponto percentual devido à inflação mais alta, mas essa discussão não é uma preocupação só aqui no Brasil. o impacto do mercado de trabalho aquecido e da crise climática sugerem uma inflação mais resiliente e, no Brasil, está claro que o Copom acelerará o aumento das taxas de juros”, afirma Roberto Padovani, economista-chefe do Banco BV.
Portanto, o consenso entre os analistas é que o ritmo de aumento dos juros está se acelerando, mas não muito, e isso dependerá dos anúncios do governo na área fiscal. O consenso é que não haverá surpresa no próximo Copom e a taxa Selic subirá 0,50 ponto percentual. “O Copom manterá o ritmo esperado e fará ajustes, se necessário, na próxima reunião. Com a inflação correndo o risco de permanecer acima do teto, o BC pode ter que ser mais agressivo. restará uma mudança mais agressiva para mudar essa trajetória”, explica Sergio Vale.
Pressões crescentes
Caio Megale, economista-chefe da XP Investimentos, reconhece que os cenários interno e externo pioraram desde a última reunião do Copom, com probabilidade de Trump vencer a eleição e o dólar mais forte. Portanto, um aumento de 0,50 ponto percentual na taxa Selic é o mais provável, em sua avaliação de que pretende rever o cenário após o Copom elevar a projeção para a Selic ao final deste ciclo de ajuste monetário. “Atualmente ainda mantemos nossa previsão oficial de 12%, mas as medidas de corte de gastos não são muito claras, e as autoridades só sinalizam ajuste em 2026, que é ano eleitoral, algo improvável”, afirma.
Megale lembra que a despesa pública continua a aumentar há três anos, portanto, “o desafio da política monetária será maior”. Ele reconhece que o patamar mais provável para a Selic no final do ciclo é subir para 13% ao ano e destaca que o aumento dos preços das carnes e da energia também ajudam a pressionar o IPCA. “A inflação está mais alta acima do topo da banda do que da meta e tudo leva a concluir que a inflação 18 meses à frente, que é o horizonte relevante para o qual o Banco Central olha, permanecerá mais próxima de 5% do que de 3%”, disse ele. explica.
A economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, destaca que o câmbio mais valorizado é um risco para a inflação prospectiva, e sua projeção atual para o IPCA, de 4,5% no final do ano, tem chance de ser revisada novamente para cima , bem como o ciclo de ajuste monetário, atualmente em 200 pontos-base, ou seja, uma Selic terminal de 12,50%. “As expectativas de inflação estão desequilibradas, assim como o próprio cenário de atividade. Os números são bons (no terceiro trimestre do ano) e isso reforça a avaliação de que será necessária uma política monetária mais restritiva.”
Na avaliação do economista Carlos Thadeu de Freitas Gomes, ex-diretor do Banco Central e consultor externo da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC), o Banco Central não tem outra alternativa senão acelerar o ritmo de aumento das tarifas . Selic, porque a inflação deste ano está subindo e acima do teto da meta. “O BC deveria ter aumentado os juros antes, agora terá que continuar aumentando a Selic, mas o Copom tem limite para subir os juros. Se subir muito, será um problema também para a atividade econômica”, disse. explica. Pelas estimativas do ex-diretor do BC, se o Copom for muito rígido e o BC for verdadeiramente independente, a Selic deverá encerrar o ciclo subindo a 13,50% ao ano. Este será um desafio para o futuro presidente do BC, o diretor de Política Monetária, Gabriel Galípolo. Ele tomará posse em janeiro de 2025 e terá que enfrentar esse desafio de preservar a credibilidade do BC no mercado financeiro e provar que não haverá interferência política na instituição, como ocorreu no governo da ex-presidente Dilma Rousseff.
“Os modelos mostram que a Selic precisará chegar a 13,50% e o Banco Central precisará mostrar que tem credibilidade. Esse é o grande problema. O novo presidente do BC precisará ganhar credibilidade e, para isso, ele terá que agir tecnicamente e, nesse sentido, os juros terão que ser aumentados”, explica. Agora, se a meta mudar, o BC não precisará subir tanto a taxa Selic. “A economia interna mais aquecida pede juros mais altos e não há muita alternativa, porque no cenário externo também há muita incerteza e a inflação nos Estados Unidos não está rendendo o esperado”, acrescenta Freitas.
Silvia Matos, coordenadora do Boletim Macro do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (FGV Ibre), reforça que não há dúvidas de que a piora das expectativas de inflação e o real mais desvalorizado contribuem para um maior aperto da política monetária. “Os choques de oferta podem contaminar os núcleos e a atividade e o mercado de trabalho sofre uma desaceleração, mas muito gradual. E por fim, o risco fiscal aumentou”, afirma. Por enquanto, ela prevê que a Selic termine o ano em 11,75%, em linha com o mercado, e outro reajuste de 0,25 ponto percentual em janeiro. “E, depois, a Selic deve ficar nesse patamar por muito tempo, sem previsão de queda”, aposta.
Em artigo do Boletim Ibre, escrito com o economista Armando Castelar, Silvia Matos defende um ajuste fiscal urgente. “Desde o final de 2022, o Brasil vive uma significativa deterioração fiscal, com forte aumento dos gastos e aumento persistente da dívida pública. Isso sem adotar medidas capazes de dar uma resposta adequada aos riscos daí decorrentes. o que está acontecendo viu que houve sucessivas propostas de mais e novos gastos, como se o problema não existisse”, destaca o texto, lembrando que a dinâmica das contas públicas é semelhante à das vésperas da grande recessão de uma década atrás, quando o défice nominal situou-se em 10% do Produto Interno Bruto (PIB).
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