O trabalho da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) de cultivo de espécies nativas em ambiente de laboratório tem potencial para promover a conservação ambiental e desenvolver novas práticas de cultivo. O convidado de CB.Agro — programa resultante da parceria entre o Correspondência e TV Brasília — nesta sexta-feira (24/5), a bióloga e pesquisadora da Embrapa Recursos Genéticos e Biotecnologia (DF), Dulce Alves, contou como quatro anos de trabalho possibilitaram o cultivo inédito, em laboratório, do chamado Chuveirinho faça Grosso.
“Recebi a semente de um colega. Ele me trouxe um saco de sementes, disse ‘é lindo, a planta é linda. Tentei terminar e não consegui, mas você tem mais paciência que eu. Você vai conseguir’. E aí, com o tempo, tive que colocar a semente na lupa, porque era do tamanho de um grão de areia, e aí eu vi o que era a semente. Comecei a trabalhar com sua germinação. Peguei o plano e mudei a escala. A partir de uma semente do tamanho de um grão de areia consegui cultivá-la e mudei o tamanho dos vasos em que cultivava. E aí, entre o terceiro e o quarto ano, ganhei uma planta florida, com todas as estruturas reprodutivas. É uma planta majestosa”, disse ele.
Dulce explicou que cultivar flores nativas do Cerrado, como o Chuveirinho, de forma não natural é difícil, mas não é impossível como normalmente se pensa. Filha de pai amante de orquídeas, a pesquisadora encontrou, durante a pandemia de Covid-19, a motivação para buscar o cultivo de flores nativas em laboratório: preservar a beleza tão cara aos olhos.
“Nunca combinei ciência com beleza. Para mim, eram apenas sementes. Até que, durante a pandemia, resolvi começar a cultivar essas espécies. Percebi que muitas das espécies que considero mais bonitas estão ameaçadas de extinção. E aí pensei ‘posso cultivar e promover a conservação dessas espécies através do cultivo?’, e aí recebi a semente da chuva do meu colega”, contou.
A pesquisadora conta que aprendeu com os japoneses a valorizar a beleza da biodiversidade do Cerrado. Uma visita que recebeu, na Embrapa, contou-lhe sobre o grande interesse dos japoneses pelas plantas ornamentais, o que despertou sua atenção para o potencial estético das plantas do Cerrado.
“O Brasil tem um potencial inimaginável com plantas ornamentais. O problema é que ainda não exploramos isso. Percebi isso, que existe um mercado global para isso, quando recebi um japonês. Ele veio para a Embrapa Recursos Genéticos e disse ter muito interesse por plantas ornamentais. Aí percebi que devemos ter plantas com potencial ornamental que não estamos explorando”, lembrou.
A importância de conhecer a beleza do Cerrado
Para Dulce, a percepção de beleza na vegetação do Cerrado não é comum, por se tratar de um ambiente de savana. Assim, a preservação do bioma sofre com a priorização da Floresta Amazônica e da Mata Atlântica, que têm maior visibilidade. Porém, uma mudança de perspectiva que traga maior percepção de beleza à vegetação nativa do Cerrado também pode estimular um aumento na preocupação com a preservação do bioma.
“Para muita gente o Cerrado é considerado feio, porque tem plantas com tronco torto, as árvores não são grandes, então as pessoas não entendem bem porque deveriam conservar o Cerrado. Mas as bacias aquíferas têm origem aqui, temos uma biodiversidade enorme. Como temos uma seca muito prolongada e nossos solos são argilosos, eles possuem uma propriedade química que retém água. Nossas plantas utilizam, com suas raízes, essa água que fica presa no solo para sobreviver à seca severa. E tem plantas lindas, então é um visual que precisa ser mudado”, argumentou.
Dulce explica que explorar o cultivo dessas plantas nativas para paisagismo tem um grande potencial mercadológico. Além de possibilitar o fomento da economia, a compra de sementes tem grande valor social, pois beneficia as famílias produtoras rurais.
“Hoje, o Chuveirinho do Cerrado e diversas sementes também podem ser adquiridos nessas redes de sementes. Esse valor que é gerado ajuda as famílias do campo, famílias que mantêm o cerrado em pé, a se sustentarem. Então, tem um fator social, e meu sonho é que isso realmente mude de escala, porque eu estou em uma escala dentro da minha empresa em uma estufa, mas que eu consiga parcerias para realmente disponibilizar isso para a população comprar”, ele adicionado.
*Estagiário sob supervisão de Ronayre Nunes
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