Na noite em que o dólar comercial disparou para o recorde de R$ 5,91, o ministro da Fazenda, Fernando Haddad, finalmente anunciou, em rede nacional, o tamanho do pacote de corte de gastos que o governo pretende implementar nos próximos dois anos, de R$ US$ 70 bilhões. Em seu discurso de pouco mais de sete minutos, o ministro evitou usar a expressão “corte de gastos” e afirmou que as medidas deveriam gerar “economia” no Orçamento da União.
Entre as principais medidas do pacote — que ainda deverá ser detalhada pela equipe econômica esta manhã — estão, por exemplo, limitar o reajuste do salário mínimo à regra do novo quadro fiscal; abono salarial para quem recebe até R$ 2.640 (hoje, R$ 2.824), convergindo posteriormente para 1,5 salário mínimo; impor uma idade mínima de reforma para os militares e limitar as pensões; destinar 50% das alterações da comissão à Saúde; alteração da faixa de isenção do Imposto de Renda para quem ganha salário mensal de R$ 5 mil por meio de remuneração para quem ganha mais de R$ 50 mil por mês; e fazer cumprir o teto salarial dos funcionários públicos, acabando com os supersalários.
Ao confirmar a ampliação da isenção do IR, o ministro reforçou as promessas de campanha. Segundo ele, a mudança é a “maior reforma de renda” da história do país.
O deputado governista Odair Cunha (PT-MG) disse, ontem à noite, que a isenção do IR será enviada ao Congresso Nacional por meio de um Projeto de Lei Complementar (PLP) separado do pacote tributário, devendo ser analisado e votado apenas no próximo ano . Segundo ele, o esforço será no sentido de estabelecer uma contenção dos gastos públicos. Conforme afirmou o deputado José Guimarães (PT), líder do governo na Câmara, o pacote prevê redução de R$ 30 bilhões no próximo ano, e de R$ 40 bilhões em 2026.
Segundo Haddad, tanto o Supremo Tribunal Federal (STF) quanto o Congresso Nacional envidaram esforços para aprimorar as regras previstas no marco fiscal do Orçamento. No caso das emendas parlamentares, elas não poderão crescer acima do limite das regras fiscais — que limita o aumento das despesas a até 2,5% acima da inflação — e que 50% das emendas das comissões do Congresso serão destinadas obrigatoriamente ao Sistema Único de Seguros Nacionais . Saúde (SUS).
Em caso de défice primário nas contas públicas, o ministro destacou que será proibida a criação, ampliação ou prorrogação de benefícios fiscais. Sobre as mudanças que considera “justas e necessárias” nas aposentadorias militares, Haddad disse que elas “vão promover mais igualdade, com o estabelecimento de uma idade mínima para a reserva e a limitação das transferências de pensões”.
Em seu depoimento, Haddad não informou a idade mínima para reserva paga. Na semana passada, o Correio disse que ela poderia completar 55 anos. Quanto à transferência previdenciária, a medida deve restringir o benefício apenas aos familiares de primeira ordem (cônjuge ou companheiro e filhos).
As negociações sobre ajuste fiscal com o Congresso Nacional continuam até hoje. Logo pela manhã, Haddad apresentou os detalhes do pacote, ao lado da ministra do Planejamento e Orçamento, Simone Tebet, e do ministro-chefe da Casa Civil, Rui Costa. Depois, o chefe da equipe econômica irá ao Senado, onde participará da reunião de líderes com o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG) e senadores. Há expectativa de que os textos das propostas sejam enviados hoje ao Legislativo. Segundo fontes ligadas ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), haverá um esforço para votação do texto antes do recesso parlamentar, no dia 22. Apesar do prazo apertado, acredita-se que as medidas serão aprovadas.
Repercussão das medidas
O pacote com cortes de gastos era uma promessa de Haddad que estava adiada desde o final de outubro, na tentativa de acalmar os ânimos do mercado. Devido ao aumento da incerteza sobre a capacidade do governo de equilibrar as contas públicas e estabilizar o crescimento da dívida pública em relação ao Produto Interno Bruto (PIB), o dólar não parou de subir desde então. E, ao confirmar um corte de R$ 70 bilhões, entre 2025 e 2026, junto com a isenção do IR, que pode custar cerca de R$ 50 bilhões, Haddad jogou um balde de água nas expectativas do mercado.
“O anúncio não trouxe nenhuma novidade em relação ao que era esperado, apenas a isenção do IR para quem ganha até R$ 5 mil. A questão toda é que, muito provavelmente, parte desses R$ 70 bilhões que o governo está tentando cortar serão perdidos com essa isenção”, lamentou Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados. Ele lembrou que “não está muito claro como o governo conseguirá compensar o benefício” e, como o pacote está “aquém do necessário, com ajustes estruturais muito preliminares e muito incipientes. ajuste fiscal mais profundo a partir de 2027″. Para a Vale, a situação fiscal deverá piorar e o mercado financeiro não se acalmará nos próximos meses. “Continuaremos a ter muita tensão nos próximos dois anos”, acrescentou.
O especialista em contas públicas Felipe Salto, economista-chefe da Warren Investimentos, classificou as dimensões do pacote “inferiores às necessárias para recuperar a credibilidade e alcançar o equilíbrio fiscal”. “Entendemos que as ações anunciadas pelo ministro são positivas, em geral, contribuindo para o acerto de contas. Porém, são insuficientes para produzir um resultado primário adequado à meta estabelecida em lei”, afirmou.
O economista e consultor André Perfeito foi categórico após o anúncio de Haddad. Para ele, suas declarações não deveriam alterar os preços dos ativos hoje. “O ministro reiterou o esforço fiscal do governo, mas não deu detalhes. Dito isto, não deveremos ver alterações significativas nos principais preços da economia, especialmente no dólar e nas taxas de juro. O discurso formal de Haddad reitera a perspectiva gradualista do governo. Mantemos nossa recomendação sobre títulos pós-fixados”, resumiu.
Pontos principais
Isenção de IR: “Honrando os compromissos assumidos pelo presidente Lula, com a aprovação da reforma de renda, parte importante da classe média, que ganha até R$ 5 mil por mês, deixará de pagar Imposto de Renda”
Subsídio salarial: “Para atender às famílias que mais necessitam, o abono salarial será garantido a quem ganha até R$ 2.640. Esse valor será atualizado pela inflação nos próximos anos e terá caráter permanente quando corresponder a um salário mínimo e meio”
Congresso Nacional: “O valor global das emendas parlamentares crescerá abaixo do limite das regras fiscais. Além disso, 50% das emendas das comissões do Congresso irão necessariamente para a saúde pública, reforçando o SUS”
Militares: “Para as aposentadorias militares, promoveremos mais igualdade, com o estabelecimento de idade mínima para a reserva e a limitação de transferências previdenciárias, além de outros ajustes. São mudanças justas e necessárias”
Salário mínimo: “Esse direito, esquecido pelo governo anterior, voltou com o presidente Lula. E com as novas regras propostas, o salário mínimo continuará subindo acima da inflação, de forma sustentável e dentro da nova regra fiscal”
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