Menos exportações e mais importações foram a cara da balança comercial brasileira em 2024 e analistas apostam em uma nova safra recorde que contribuirá para aumentar a balança comercial neste próximo ano.
A Associação de Comércio Exterior do Brasil (AEB) estima que, em 2025, a balança comercial brasileira deverá registrar superávit comercial de US$ 93 bilhões, o que indicaria um aumento de 23,7% em relação aos US$ 75,2 bilhões estimados para 2024. A AEB ainda prevê que as exportações deverão atingir US$ 358,8 bilhões, aumento de 5,7% em relação a 2024, e as importações totalizarão US$ 265,7 bilhões no próximo ano, o que representa um aumento de 28,3% em relação ao valor projetado para o ano passado.
A entidade destaca que, após anos de estabilidade, o valor do dólar voltou a ter importância nas operações de comércio exterior, principalmente devido às fortes oscilações recentes. Considerando o cenário político interno, os níveis das taxas de juros internacionais e domésticas, as taxas de inflação, a dívida pública federal, as contas governamentais, entre outros fatores, projeta uma taxa de câmbio oscilando entre um piso de R$ 5,60 e um teto de R$ 6,40. Um dólar mais forte, embora mau para a inflação interna, é bom para os exportadores, porque os produtos nacionais tornam-se mais competitivos.
Saldo inferior
Segundo os dados mais recentes divulgados pela Secretaria de Comércio Exterior (Secex), do Ministério da Indústria, Desenvolvimento, Comércio e Serviços (Mdic) até a 3ª semana de dezembro, mostram que as vendas de produtos brasileiros para outros países caíram 1 , 9% em 2024, totalizando US$ 329,3 bilhões, enquanto as aquisições cresceram 8,5% e atingiram US$ 258,1 bilhões. Nesse período, o comércio aumentou 2,4%, totalizando US$ 587,4 bilhões.
Com isso, a balança comercial encolheu 27,2%, para US$ 71,1 bilhões no acumulado do ano até a terceira semana do mês passado. Apesar da queda, as exportações deverão registrar a segunda ou terceira melhor marca da história. O resultado negativo foi puxado pela forte queda nas exportações do agronegócio, como soja, que, até novembro, caiu 17,9%, frente ao mesmo período de 2023, e milho, que, na mesma base de comparação, registrou queda de 40,5%.
Apesar da redução nos valores de exportação do agronegócio, a produção manteve-se praticamente estável em quantidade, com ligeiro crescimento de 2,1% no acumulado do ano até novembro. Na opinião do especialista em comércio internacional, consultor e cofundador da BMJ Consultores Associados, Welber Barral, a principal explicação para essa queda na participação de produtos historicamente fortes na balança se deve à queda do preço dessas commodities no mercado mercado internacional.
“Nos últimos quatro anos, o Brasil teve um superávit muito grande na balança comercial. Chegou a quase US$ 100 bilhões. Em 2024, começamos a ver uma tendência diferente: o Brasil não reduziu a quantidade exportada. Safras recordes, mantiveram essencialmente a quantidade exportada, mas o preço diminuiu na maioria das commodities. Então, isso afetou o valor total exportado”, explica Barral.
O economista do Conselho Econômico Regional do Paraná (Corecon-PR) Carlos Alberto Decotelli, porém, avalia que há dois fatores que o agronegócio deve levar em consideração para voltar a ter um ritmo de crescimento maior: aumento da diversidade logística, com ampliação das rotas comerciais, além de ampliar a variedade de parceiros.
“Temos que ter uma saída pelo Pacífico, para que haja redução dos custos logísticos. Quanto mais caros os custos logísticos, maiores serão os obstáculos em termos de sustentação do fluxo comercial”, sustenta Decotelli. “Também haverá maior expansão do agronegócio justamente no momento em que houver maior diversidade em relação aos clientes internacionais que fazem negócios com o Brasil”, afirma ainda o economista.
Por outro lado, a indústria extrativa continuou crescendo ao longo do ano e aumentou 6,5% no valor exportado até novembro, com destaques positivos para minérios de cobre (21%), alumínio (35,1%), além de óleos brutos de petróleo (9,5 %). Houve crescimento também na indústria de transformação, que subiu 3%, com a produção de veículos para transporte de mercadorias, autopeças e aeronaves entre os principais segmentos que avançaram em 2024.
No caso das importações, houve forte aumento no valor dos desembarques de bens industriais, de 20,9%, e de bens de consumo (25,6%) e de bens intermediários (6,9%). Apenas os combustíveis registaram queda: 4,9%. Na análise de Barral, o crescimento das importações está diretamente ligado ao crescimento da atividade econômica do país, com aumento mais forte do Produto Interno Bruto (PIB).
“Quando há aumento do crescimento econômico no Brasil, aumentam as importações, não só de bens de consumo, mas também de bens de capital, o que é positivo e indica investimento da indústria brasileira. E a importação de insumos para atender à demanda interna no Brasil” , avalia Welber Barral. “Devemos fechar este ano com um superávit muito importante, próximo de US$ 70 bilhões, mas inferior ao registrado nos últimos anos”, acrescenta.
Recuperação
Apesar de estimar uma recuperação para o próximo ano, a AEB avalia que ainda é necessária cautela, considerando que diversas variáveis podem influenciar esta estatística, como as guerras na Europa de Leste e no Médio Oriente e a eleição de Donald Trump nos Estados Unidos. “Independentemente do nível da taxa de câmbio atual, as exportações de produtos manufaturados do Brasil têm como principal mercado de destino a América do Sul, embora, no momento, estejamos testemunhando uma política comercial agressiva da China nesta região, retirando a liderança do Brasil nas exportações para seus vizinhos”, destaca.
Mesmo com a balança comercial menos favorável, o ano de 2024 ficará para a história pela celebração da conclusão do acordo entre a União Europeia (UE) e o Mercosul, após 25 anos de negociações. Juntos, os dois blocos têm um PIB de US$ 22 trilhões e, segundo pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), se implementado, o pacto poderá gerar um aumento de 0,5% no PIB do Brasil ao ano. ano.
“É um avanço muito importante, acho extremamente relevante o acordo entre o Mercosul e a União Europeia, principalmente neste momento em que corremos o risco de aumentar o protecionismo com o governo de Donald Trump, ou sermos realistas de que não há efeito imediato”, avalia Barral. Embora tenha sido anunciado, o acordo ainda precisa ser aprovado pelos parlamentares dos países-membros e isso pode levar muito tempo. A principal resistência dentro do bloco europeu vem da França e da Itália.
“Em outras palavras, estamos falando de um passo que depois vai para a revisão jurídica entre os membros do Mercosul e da União Europeia, depois para os parlamentos nacionais e o Parlamento Europeu para aprovação. Portanto, estamos falando de um período de quatro a cinco anos para entre em vigor”, explica o especialista em comércio internacional.
Incertezas
Também ainda há muita incerteza em relação ao comércio entre o Brasil e os Estados Unidos, que atingiu um volume de US$ 73,9 bilhões em comércio de janeiro a novembro de 2024.
Com a vitória de Trump nas eleições presidenciais, a partir da sua posse no dia 20, poderá haver mudanças nesta relação. Recentemente, o presidente eleito ameaçou aumentar as tarifas sobre os produtos importados brasileiros, acusando o país de cobrar muitos impostos. Segundo ele, “a Índia cobra muito, o Brasil cobra muito” e, em resposta, sinalizou que os EUA “vão cobrar a mesma coisa”.
Apesar disso, uma mudança tarifária não seria tão simples como se imagina, segundo o professor de Economia da Universidade de Brasília (UnB) Newton Marques. “Não é tão fácil para Trump mudar isso de repente. Porque você pode imaginar os importadores norte-americanos. Eles também precisam de importações dos países do Brics para poderem exportar. Então, o jogo é bilateral. Não existe um jogo unilateral”, disse ele. destaques.
“Tomar medidas repentinas pode perturbar muito os parques produtivos e as partes económicas dos países, especialmente dos EUA, porque aproveitaram os preços de importação mais baixos para poder garantir um certo nível de atividade económica”, afirma o académico.
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