O Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial, acelerou em dezembro em relação a novembro, com alta de 0,52%. Com isso, o indicador fechou o ano acumulando alta de 4,83%, acima do teto da meta estabelecida pelo Conselho Monetário Nacional (CMN), de 4,50%.
Tradicionalmente, quando a meta de inflação não é cumprida, o presidente do Banco Central é obrigado a enviar uma carta aberta ao presidente do CMN explicando os motivos do ocorrido. Assim, informou o BC, ontem, chega a oito o número de vezes que isso ocorreu desde a criação do regime visado, em 1999. Só em 2017 o limite mínimo foi ultrapassado, em vez de o limite máximo ter sido ultrapassado.
A atual meta de inflação é de 3%, com margem de tolerância de 1,5 ponto percentual para cima ou para baixo. Na carta enviada ao ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que preside o CMN, o novo presidente do BC, Gabriel Galípolo, atribuiu o cumprimento da meta ao forte crescimento da economia, à desvalorização do real e ao clima fatores.
Indicado pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), o novo presidente do BC não foi muito crítico em relação à questão fiscal, principal motivo de preocupação dos agentes financeiros. O termo foi mencionado apenas duas vezes no documento de 17 páginas. “No nível interno, a percepção dos agentes econômicos sobre o cenário fiscal afetou significativamente os preços dos ativos e as expectativas dos agentes, especialmente o prêmio de risco, as expectativas de inflação e a taxa de câmbio”, destacou trecho do texto.
Em 26 anos de regime de metas de inflação no Brasil, o estouro ocorreu em 2001, 2002, 2003, 2015, 2017, 2021, 2022 e 2024. Este ano também marca o terceiro descumprimento em um curto espaço de quatro anos. Somente em 2023 o indicador fechou dentro do teto estabelecido, em 4,62%.
A última vez que a meta de inflação foi descumprida foi em 2022, em pleno ano eleitoral, o ex-presidente Roberto Campos Neto justificou a ultrapassagem do limite por fatores como a alta do preço do barril de petróleo e a recuperação da economia .
Vilões do custo de vida
Segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), os maiores impactos no IPCA de 2024 vieram dos preços de alimentos e bebidas. Os itens alimentares foram influenciados por condições climáticas adversas em diversas épocas do ano. “O destaque no IPCA foi o grupo de alimentação e bebidas, grupo de maior peso no orçamento familiar. Problemas climáticos, como chuvas no Sul e queimadas, prejudicaram a oferta de produtos frescos”, destacou o gerente da pesquisa Fernando Gonçalves.
Carnes, azeite, óleo de soja, café moído e leite longa vida estão entre os itens que mais subiram de preço no último ano, apontados como vilões da inflação. “A seca que atingiu parte do país pressionou os preços dos alimentos, especialmente carne e leite, devido à deterioração das pastagens, e de produtos como café e laranja. O ciclo do gado teve um impacto significativo nos preços da carne e mais forte do que o esperado, somando-se aos efeitos da seca e da depreciação cambial sobre esses preços”, explica a carta.
Assim como em 2023, a gasolina teve o maior impacto individual no índice, acumulando alta de 9,71% no ano passado. Em segundo lugar estão os planos de saúde, que subiram 7,87% em 12 meses, seguidos pelo subitem refeição fora de casa, que acumulou alta de 5,70%.
Para o economista Volnei Eyng, CEO da Multiplike, os dados levantam um alerta importante sobre os desafios da estabilização da inflação no Brasil. “Para o consumidor, a persistência da inflação em itens essenciais, como alimentação e transporte, agrava o custo de vida, desgastando o poder de compra e afetando principalmente as famílias de menor renda, que destinam maior proporção do seu orçamento a esses itens”, disse. avaliado. .
Do ponto de vista econômico, os dados indicam que o BC seguirá uma política monetária contracionista, elevando ou mantendo juros mais elevados. Juros mais elevados encarecem a contratação de crédito e reduzem o consumo da população, o que leva ao controle da inflação. “Embora esta decisão seja necessária para combater a resistência inflacionária, ela também coloca desafios significativos à recuperação económica. Taxas de juro mais elevadas desencorajam o consumo e o investimento, além de dificultar a implementação de políticas públicas focadas na recuperação”, destacou Eyng. Segundo ele, este cenário reforça o dilema enfrentado pela política económica: “conter a inflação no curto prazo sem comprometer o crescimento sustentável, um equilíbrio cada vez mais difícil num contexto de pressões inflacionistas persistentes”.
Desafios da política monetária
Na carta enviada ao CMN, o chefe do BC alertou para a inflação elevada até o terceiro trimestre de 2025, sinalizando que os desafios permanecem ao longo deste ano. As projeções do mercado já indicam que o IPCA deste ano será superior ao de 2025, provavelmente acima de 5%, o que implicará em mais um descumprimento da meta.
A justificativa da carta também destacou os esforços da autarquia que fizeram a autoridade monetária aumentar a taxa básica da economia (Selic), no final do ano passado, para 12,25% ao ano, e sinalizar mais dois aumentos da mesma magnitude no início do ano. ano.
“Embora o documento siga o protocolo, mostra que o impacto das taxas de câmbio na inflação continua a ser um dos principais desafios económicos enfrentados pelo país”, afirmou André Matos, CEO da MA7 Negócios. “Esses dados deverão influenciar diretamente a próxima reunião do Copom, que provavelmente intensificará uma política de aumento dos juros, possivelmente aumentando 1%, na tentativa de levar a inflação para a meta”, acrescentou, alertando para os efeitos colaterais na atividade devido à aumentar o custo do crédito.
“O cenário exige também um alinhamento firme entre a política monetária e fiscal para recuperar a confiança do mercado e conter as pressões inflacionistas sem comprometer o crescimento económico”, defendeu Carlos Braga Monteiro, CEO do Grupo Studio.
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