A semana começou com mercados de ações em queda em todo o mundo e o dólar em alta, em meio a temores crescentes de que a economia dos EUA Estados Unidos podem entrar em recessão.
A bolsa de Tóquio, no Japão, caiu 12% nesta segunda-feira (8/5), o pior resultado em 37 anos, criando uma reação em cascata em outras bolsas asiáticas, como Coreia do Sul (-8,8%), Taiwan (-8,35%). %), Singapura (-4,07%) e Índia (-2,6%).
Nos Estados Unidos, os índices Nasdaq (-3,43%), S&P 500 (3%) e Dow Jones (-2,6%) também registaram quedas.
No Brasil, o Ibovespa caiu 0,46%, depois de cair mais de 2% no mínimo do dia, e o dólar fechou em alta de 0,53%, a R$ 5,74, após atingir R$ 5,86 na máxima de segunda.
Mas o que essa piora generalizada dos mercados financeiros significa para o Brasil?
E como a perspectiva de desaceleração da economia americana afeta o cenário dos juros e do dólar aqui?
Conversamos com três economistas para entender melhor o que está por vir.
Recessão nos EUA?
Os agentes do mercado financeiro têm acompanhado de perto a dinâmica do inflação nos países de economia avançada, na expectativa de encontrar sinais que permitam aos bancos centrais iniciar o processo de flexibilização da política monetária – ou seja, corte das taxas de juro.
Nos últimos anos, os bancos centrais de todo o mundo aumentaram as suas taxas de juro para conter o aumento da inflação resultante de grandes choques como a pandemia da Covid-19 e a guerra na Ucrânia.
Quando as taxas de juro sobem, torna-se mais caro o crédito às famílias e às empresas, o que funciona como um travão ao consumo e ao investimento, desacelerando a economia e a inflação.
O oposto ocorre quando as taxas de juros caem.
Nos Estados Unidos, os mercados começaram o ano com a expectativa de que o primeiro corte de juros por parte do Fed (Federal Reserve, banco central americano) ocorresse em março, expectativa que foi adiada para junho e agora para setembro.
Na sexta-feira (8/2), porém, dados de emprego muito abaixo do esperado – criação de 114 mil empregos em julho nos EUA, ante expectativas de 185 mil – dispararam sinais de alerta nos mercados, com a leitura de que a economia americana poderá já será mais fraco do que se pensava anteriormente.
Com isso, alguns analistas passaram a avaliar que o Fed pode ter perdido o momento certo para começar a cortar as taxas de juros, o que obrigaria a autoridade monetária norte-americana a fazer uma sequência mais abrupta de cortes nos próximos meses.
“É isso que está a acontecer: os mercados estão tensos, as taxas de juro estão a cair, as ações estão a cair, tudo em reação à perspetiva de um abrandamento económico mais forte. [nos EUA]“, observa Flávio Serrano, economista-chefe do Banco BMG.
“E a percepção de maior risco faz com que as moedas, principalmente dos países emergentes, sofram um pouco”, acrescenta.
Assim, crescem as apostas de que a Fed poderá fazer três cortes nas taxas de juro de 25 pontos base (0,25 pontos percentuais) até ao final do ano, do nível actual de 5,25% para 5,5% ao ano.
“Mas já está sendo discutido se não seria o caso de começar com 50 pontos de corte [em setembro]considerando que o Fed pode ter esperado muito tempo, e agora a desaceleração económica exigirá cortes mais rápidos para evitar problemas maiores”, diz Serrano.
Alessandra Ribeiro, diretora de macroeconomia da Tendências Consultoria, avalia, porém, que ainda é cedo para falar em recessão nos Estados Unidos.
“Precisamos aguardar novos indicadores, porque sempre há volatilidade nos dados”, diz Ribeiro.
“Também porque vimos dados muito bons até ao segundo trimestre – o próprio PIB [Produto Interno Bruto] dos Estados Unidos ficou acima das expectativas – pelo que ainda há sinais de resiliência na actividade americana. Portanto, não é óbvio dizer que o cenário mais provável é uma recessão naquele país.”
E o Brasil com isso?
Para Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, essa piora do cenário externo é preocupante, num momento em que o Brasil também enfrenta turbulências internas, principalmente pelas preocupações com o equilíbrio das contas públicas do governo federal.
“Isso deve significar que o governo olhe para o fiscal com ainda mais cuidado, para evitar que o país seja fortemente contaminado por uma possível recessão nos Estados Unidos”, diz Vale.
Ele lembra que isso aconteceu em 2008 e 2009, quando houve a última grande recessão americana.
Naquela época, o Brasil estava em excelentes condições, avalia a Vale, o que permitiu ao país ter apenas uma curta recessão, seguida de uma rápida recuperação.
“Agora é diferente, temos um cenário fiscal muito pior do que em 2008, com dificuldade de melhorar isso nos próximos anos, o que significa que tendemos a sentir a volatilidade de forma bastante intensa [externa]“, observa o economista.
Uma possível repercussão disso seria a permanência do dólar sob pressão por mais tempo, o que poderia afetar a inflação.
Um real desvalorizado por um longo período afeta os preços dos bens importados – como componentes utilizados pela indústria, por exemplo – mas também de produtos cujos preços são determinados pelos preços internacionais, como os combustíveis.
Os preços dos alimentos também poderão ser afectados, uma vez que um real desvalorizado favorece as exportações, reduzindo a oferta interna de produtos exportados.
“Esse é o grande medo que temos hoje: quanto mais tempo o câmbio ficar nesse patamar elevado, maior será a pressão sobre a inflação, mais trabalho o Banco Central terá que fazer em relação à taxa de juros e, no futuro, tudo o que está acontecendo pode significar menor crescimento.”
Assim, após dois anos de crescimento acima de 2% em 2023 e 2024, o governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT) caminha para uma segunda metade do seu mandato com aumentos do PIB abaixo desse nível em 2025 e 2026, projeta o economista- presidente da MB Associados.
Cenários para Selic e dólar
Diante desse cenário, os três economistas ouvidos pela BBC News Brasil acreditam que o mais provável é que o Banco Central do Brasil opte por “jogar parado”.
Ou seja, manter a Selic no patamar atual de 10,5% até o final deste ano.
Isso porque a combinação de uma maior percepção de risco no mundo, aliada à incerteza fiscal no Brasil, além das incertezas relacionadas à eleição americana e à transição na presidência do próprio Banco Central aqui no Brasil não devem dar margem que o BC reduza os juros, mesmo num cenário de cortes por parte do Fed, avalia Alessandra Ribeiro, da Tendências.
Os economistas divergem, no entanto, sobre o que poderá acontecer em 2025.
Serrano, do BMG, acredita que o BC poderá retomar os cortes da Selic já em março do ano que vem, levando a taxa para 9,5% até o final de 2025.
Ribeiro, da Tendências, passou a apostar em juros básicos estáveis de 10,5% até o final do ano que vem – por conta da questão fiscal no mercado interno e da aposta da casa no favoritismo de Donald Trump nas eleições americanas.
Na visão do economista, a agenda económica do republicano – que inclui cortes de impostos para empresas e famílias americanas, o que aceleraria a economia dos EUA, mas pioraria a situação fiscal lá – poderia limitar uma queda do dólar no médio prazo, mantendo a pressão sobre inflação aqui.
Mais pessimista, a Vale, da MB Associados, já vislumbra a possibilidade de o BC ter que subir novamente a taxa Selic em algum momento.
Isso só mudaria, na visão do economista, caso ocorresse uma forte recessão nos EUA, que afetasse também o Brasil, o que abriria então espaço para o BC baixar os juros.
“Para o Brasil, há um cenário muito difícil pela frente, que deverá significar taxas de juros em 10,5% por mais tempo e uma taxa de câmbio que deverá continuar pressionada pela questão fiscal e pelos riscos externos nos EUA e no Oriente Médio, onde poderá haver uma escalada do conflito com Israel”, afirma Vale.
O economista não descarta que o câmbio possa chegar a R$ 6 em algum momento deste semestre, embora acredite que a taxa deva fechar o ano em patamar mais próximo de R$ 5,40.
No boletim Focus do Banco Central, a mediana das projeções dos economistas aponta Selic a 10,5% no final deste ano e 9,75% em 2025, e um dólar no patamar de R$ 5,30 para os dois anos.
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