Para o recentes revelações feitas pelo jornal Folha de S.Paulo sobre o trabalho dos assessores do ministro Alexandre de Moraes chefiar o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) e conduzir investigações no Supremo Tribunal Federal (STF) despertou os ânimos entre seus críticos.
A partir desta terça-feira (13/8), o jornal Folha de S.Paulo publicou uma série de reportagens sobre mensagens de WhatsApp supostamente trocadas por assessores do ministro Alexandre de Moraes no STF solicitando informalmente ao TSE a produção de reportagens sobre os investigados em fake news e inquéritos de milícias digitais envolvendo o ex-presidente Jair Bolsonaro (PL)aliados e apoiadores.
Segundo o relatório, as mensagens foram trocadas entre agosto de 2022 e maio de 2023, período que abrange tanto Campanha eleitoral de 2022 como o período pós-eleitoral.
A Folha afirma ter tido acesso a cerca de 6 gigabytes de mensagens e arquivos trocados via WhatsApp. O jornal afirmou que o material não foi adquirido por meio de hackers ou qualquer tipo de interceptação ilegal.
Em resposta à publicação, a assessoria de Moraes divulgou nota nesta terça-feira (14/8), na qual defende que solicitar informações a outros órgãos, inclusive ao TSE, é uma prática comum e justificada pelo “poder de polícia” do tribunal .
No Senado, parlamentares de oposição e críticos da atuação de Moraes, como os senadores Damares Alves (Republicanos-DF) e Rogério Marinho (PL-RN) iniciaram um movimento para pedir o impeachment de Moraes.
O movimento de oposição lançou luz sobre um dispositivo legal que, embora previsto em alguns regulamentos, nunca foi colocado em prática no Brasil: o impeachment de um ministro do STF.
A BBC News Brasil ouviu especialistas que explicaram como seria o rito de um processo de impeachment envolvendo um ministro da mais alta Corte brasileira.
Segundo eles, os procedimentos seriam muito semelhantes aos processos envolvendo presidentes da República.
Afirmam que uma das principais semelhanças é o caráter “político” do julgamento e que, atualmente, não consideram que haja situação política favorável para que um processo contra Moraes avance no Senado.
Quais crimes podem levar ao afastamento de um ministro do STF
Segundo a assessoria de imprensa do Senado, não há previsão constitucional para o impeachment de ministro do STF. Apesar disso, o inciso II do artigo 52 da Constituição Federal diz que cabe ao Senado processar e julgar os ministros do STF quanto aos crimes de responsabilidade.
Atualmente, segundo o Senado, existem 50 pedidos de impeachment contra ministros do Supremo. Destes, 21 são contra Alexandre de Moraes.
A definição de quais crimes são de responsabilidade dos ministros do STF está prevista na lei 1.079, de 1950.
Os crimes de responsabilidade dos ministros do STF são:
- Alterar decisões, salvo através de recurso, decisões ou votações já proferidas em sessão do Tribunal;
- Participar de julgamento quando, por lei, estaria impedido de fazê-lo por suspeita, que é quando um ministro ou juiz tem algum tipo de vínculo com a questão ou com as partes envolvidas no processo;
- Realizar algum tipo de atividade político-partidária;
- Descuido (negligência ou descuido) no cumprimento de deveres;
- Proceder de forma incompatível com a honra, a dignidade e o decoro das funções de ministro do STF.
Para o professor de Direito da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Clóvis Bertolini, a definição de crime de responsabilidade para ministros do STF é vaga, como acontece com presidentes da República.
“Quando a lei do impeachment foi promulgada em 1950, o Brasil vinha do regime totalitário de Getúlio Vargas e foram feitas tentativas de impedir alguns abusos cometidos nas décadas de 1930 e 1940, mas não havia detalhes sobre o que poderia constituir um crime de responsabilidade por uma ministro do STF”, disse Bertolini à BBC News Brasil.
Na avaliação do professor, a análise se um ministro cometeu ou não crime de responsabilidade depende da interpretação política dos senadores.
“No caso de impeachment dessas autoridades, a definição é muito vaga e esses critérios são atendidos ou não de acordo com a interpretação dos parlamentares que julgarão o caso. O impeachment é um processo de natureza jurídica, mas a avaliação é política” , disse a professora.
Apesar de ter afirmado que a oposição entraria com pedido de impeachment contra Moraes, a senadora Damares Alves não detalhou os supostos crimes de responsabilidade que poderiam ser imputados ao ministro.
As etapas do impeachment de um ministro do STF
Quaisquer que sejam os supostos crimes de responsabilidade a serem atribuídos a Alexandre de Moraes, um possível processo de impeachment contra o ministro deverá seguir um procedimento que, segundo especialistas ouvidos pela BBC News Brasil, deverá ser muito semelhante ao processo de impeachment do ex-presidente Fernando Collor , em 1992, e Dilma Roussef (PT), em 2016.
Clóvis Bertolini e Rodrigo Kanayama, também professor de Direito da UFPR, afirmam que o processo teria as seguintes etapas:
- Autorização: Cabe ao presidente do Senado autorizar ou não o início do processo de impeachment de um ministro do STF. Se ele autorizar, o caso passa para a próxima fase;
- Comissão especial: É criada uma comissão especial formada por membros do Senado. Este comitê terá a função de elaborar um relatório sobre a denúncia e aprovar preliminarmente se ela atende ou não aos requisitos legais. Após a elaboração do relatório, ele pode ser aprovado ou rejeitado. Se aprovado por maioria simples (metade mais um dos presentes na comissão), o relatório é encaminhado ao Plenário do Senado;
- Admissibilidade em Plenário: caberá ao Plenário do Senado votar a admissibilidade da denúncia. Se o relatório for aprovado por maioria simples, o processo de impeachment continua. Caso isso ocorra, o ministro é afastado do cargo por um período de até 180 dias. Se o caso não for julgado nesse prazo, o afastamento liminar perde a validade e o ministro poderá retornar ao cargo até que o caso seja finalizado;
- Julgamento: Nessa fase, são coletadas provas e depoimentos e o ministro alvo do processo pode, se desejar, fazer sua defesa no Plenário do Senado. Nesta fase, os trabalhos de julgamento no Senado serão realizados pelo presidente do STF. Ao final desta fase, é feita uma votação. Para perder o cargo, pelo menos dois terços dos senadores devem votar a favor do impeachment.
Caráter político e originalidade
Os professores destacam que a relação entre os Poderes é um dos motivos pelos quais, apesar de possível, o impeachment de um ministro do STF nunca se concretizou.
Segundo eles, um impeachment como esse dependeria de condições políticas muito específicas e críticas para avançar, o que, segundo eles, não está acontecendo no momento.
Para os professores entrevistados pela BBC News Brasil, a avaliação é que não haveria um clima político favorável para que o Senado avançasse com um pedido de impeachment contra Alexandre de Moraes com base nas reportagens publicadas pela Folha de S.Paulo até o momento.
“Hoje, acho muito difícil que um processo como esse avance. Me parece muito mais um movimento do Senado para gerar autocontenção por parte do STF do que uma intenção real de ver o ministro afastado”, professor Rodrigo Kanayama disse à BBC News.
Clóvis Bertolini avalia de forma semelhante.
“É pouco provável que esse rito (impeachment) seja instaurado. As condições políticas não demonstram que isso vai acontecer. Há um certo receio entre os senadores em aprovar um pedido como esse. Um ministro do STF é uma das autoridades mais poderosas do país. da República. Há receio de possíveis retaliações caso o processo não tenha o desfecho desejado”, disse o professor.
Kanayama disse, porém, que o cenário pode mudar à medida que mais revelações sobre a atuação de Moraes no TSE e no STF vierem à tona.
“A situação política é importante. Hoje não vejo cenário favorável para que isso avance. Mas não sabemos o que o amanhã trará. Quando iniciaram o processo contra Dilma (Rousseff), também pensei que seria Não fui em frente, mas acabei cometendo um erro”, disse ele. .
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