Depois de decapitar o movimento xiita Hezbollah com o assassinato do xeque Hassan Nasrallah, Israel realizou sucessivos bombardeios no bairro de Dahiyeh, ao sul de Beirute, para eliminar Hashem Safieddine, de 60 anos. Chefe do Conselho Executivo do Hezbollah e primo de Nasrallah, Safieddine é considerado o sucessor natural para assumir a liderança do grupo. Até o fechamento desta edição, não houve confirmação da morte do clérigo xiita.
Fontes israelenses disseram ao O jornal New York Times que os mísseis tinham como alvo um bunker onde estavam reunidos os principais líderes do Hezbollah, incluindo Safieddine. A milícia cofundada por Nasrallah disparou cerca de 200 foguetes contra território israelense nesta quinta-feira (3/10), e um deles caiu no porto de Haifa (norte).
Ao mesmo tempo que intensificava os ataques a Beirute, numa estratégia clara para enfraquecer ao máximo o Hezbollah, Israel delineou planos de retaliação ao bombardeamento levado a cabo pelo Irão em 1 de Outubro, quando 200 mísseis balísticos foram lançados sobre Tel Aviv e Jerusalém. O presidente dos EUA, Joe Biden, anunciou que uma resposta israelita contra Teerão deve incluir ataques a instalações petrolíferas. “Estamos discutindo isso. Acho que seria um pouco… enfim”, declarou, sem detalhar a frase. “Nós não ‘autorizamos’ Israel a fazer nada, nós aconselhamos Israel.”
Washington discute diretamente os termos de uma represália com o governo de Benjamin Netanyahu. No sul do Líbano, as Forças de Defesa de Israel (IDF) sofreram a primeira baixa de um oficial de alta patente: Capitão Ben Zion Falac, 21, do 202º Batalhão de Brigada Pára-quedista. Com sua morte, nove soldados judeus morreram em combate. Pela primeira vez, as tropas israelitas e libanesas trocaram tiros; um soldado do Líbano morreu.
Ilusório
Cristina Pecequilo, professora de relações internacionais da Universidade Federal de São Paulo (Unifesp), explicou ao Correspondência que Israel adoptou uma estratégia sistemática de tentar eliminar a liderança do Hamas, na Faixa de Gaza, e do Hezbollah, no Líbano. “Isto é ilusório. Perde-se a liderança, mas ocorrem processos de reconstrução. Vimos este fenómeno ao longo deste século, no Líbano e em relação ao Hamas”, comentou. Ela vê uma tática israelense mais ampla de pressionar o cenário regional e criar uma situação crescente. “O ataque do Irã a Israel faz sentido, numa lógica geopolítica de reafirmação do seu poder. Agora, provavelmente teremos uma retaliação israelense. Israel mantém uma política ofensiva, que começa como uma ação contra grupos terroristas e agora envolve Estados.”
Para Gunther Rudzit, professor de relações internacionais da ESPM, Israel espera atacar o Irã para não se expor a duas ondas de mísseis, vindos de territórios libaneses e iranianos. Neste sentido, procura enfraquecer o Hezbollah. “Primeiro, eliminaram os meios de comunicação do movimento e depois a sua liderança. Hoje, o Hezbollah opera de forma localizada, já não coordenado e está bastante enfraquecido. Não é capaz de agir como uma força única. Isto leva ao enfraquecimento do Irão. Israel controlava o flanco norte do Hezbollah para então negociar com o Irã”, disse ele Correspondência.
Questionado sobre como vê a eventual retaliação de Israel contra o Irão, Rudzit disse que era difícil mensurar. “Imaginei que Biden se oporia a um ataque às refinarias iranianas, mas ele apoiou uma acção deste tipo. Qualquer pessoa que diga que sabe o que Israel fará está a mentir”, disse.
Filha de pais libaneses, a farmacêutica paranaense Sarah Melhem, de 30 anos, morava no sul do Líbano e se refugiou em Bmikin, cidade de região montanhosa de onde se tem uma vista panorâmica de Beirute. Por volta das zero horas desta sexta-feira (horário local, 18h de quinta), ela acordou com barulho de explosões. “Foram várias bombas lançadas ao mesmo tempo, em diferentes locais de Beirute”, relatou ao Correspondênciaatravés do WhatsApp. Foi o bombardeio contra Safieddine. “Foi o mesmo barulho do dia em que mataram o xeque Hassan Nasrallah. Tudo por aqui tremeu. Minha filha está com muito medo.”
O advogado Richard Moussa, 34 anos, mora em Mar Roukoz, a 7 km do centro. “Os bombardeios têm sido mais frequentes na capital, especialmente na parte sul, onde o Hezbollah mantém centros. O centro de relações públicas do movimento também foi alvo”, disse ele ao repórter por telefone. Também às 0h (horário local), ele disse ter ouvido uma “grande explosão”. “Vimos um grande clarão e depois o som da detonação. Houve mais de sete ataques aéreos.”
Para Moussa, Israel tomou a decisão de acabar com o Hezbollah. “Há um novo Médio Oriente. Todos os países árabes estão em paz com Israel. Penso que os israelitas também querem a paz com o Líbano, algo impossível enquanto o Hezbollah existir”, assegurou. “Depois que tudo acabar, temo uma guerra interna e sectária no Líbano. Em 7 de maio de 2008, dois anos após o fim da guerra com Israel, o Hezbollah invadiu Beirute e matou muitas pessoas.”
“Apavorante”
Moradora do bairro Sin El Fil, no leste de Beirute, a estagiária de direito Tatiana Al Hasrouti, 23 anos, classificou a situação na capital como “profundamente perturbadora”. “Os bombardeamentos israelitas, que se concentraram na parte sul, estão agora a atingir o centro, levando a guerra para o coração da capital. É assustador. Os israelitas têm enviado alertas a meio da noite, quando as pessoas estão a dormir e têm não há tempo para fugir a tempo. Os avisos ocorrem via X ou celular”, disse ao jornal. Correspondênciaatravés do WhatsApp.
Tatiana afirmou que não tem conseguido dormir devido aos bombardeios que ecoam pela cidade. “As explosões danificaram áreas civis, incluindo apartamentos residenciais”, disse o estagiário. “A incerteza sobre quando e onde a próxima bomba irá atingir faz-nos ter medo de nos movimentarmos pela cidade. O Exército Israelita emitiu avisos de retirada para o sul do Líbano, indicando que mais ataques poderão ocorrer a qualquer momento”, disse ele.
VOZES DE BEIRUTE
“O desgaste psicológico tem sido imenso, principalmente depois que enfrentamos a explosão no porto de Beirute, no dia 4 de abril. É como se revivêssemos aquela explosão todos os dias. o ataque ao bairro xiita de Dahiye é uma arma proibida pelo direito internacional. Israel também utilizou métodos de alta tecnologia, o que torna ainda mais difícil saber o que esperar.
Tatiana Al Hasrouti23 anos, estagiário de direito, morador do bairro Sin El Fil (leste)
“Os bombardeios ocorrem o tempo todo. Ninguém sabe quando ou onde. Os centros do Hezbollah estão localizados no bairro de Dahiye. Os israelenses também atacaram locais onde estariam indivíduos do Hezbollah. O governo libanês mostra-se irresponsável em todas as áreas. Lá. não há plano de emergência para salvar vidas. Você acha que, depois de tudo isso, este governo pode liderar uma negociação para acabar com esta guerra?
Ricardo Moussa34 anos, advogado, mora em Mar Roukoz, a 7km do centro de Beirute
“Quando chega uma determinada hora, esperamos para ver onde vão acontecer os bombardeios. Os israelenses colocam mapas nos jornais, onde apontam possíveis alvos. coisa. As noites em que foram piores. É horrível, uma sensação muito ruim. As pessoas não sabem o que fazer agora.
Sarah Melhem30 anos, farmacêutico paranaense, morava no sul do Líbano e se refugiou em Bmikin, próximo a Beirute
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