O ministro de Supremo Tribunal Federal (STF) Alexandre de Moraes removeu o sigilo sobre relatório da Polícia Federal (PF) que detalha a tentativa de “golpe de Estado e abolição do Estado Democrático de Direito” em Brasil.
Segundo a investigação, o objetivo era “tentar manter o então presidente da república JairBolsonaro (PL) no poder”, restringem “o exercício do Poder Judiciário” e impedem “a posse do então eleito presidente da república” — neste caso, Luiz Inácio Lula da Silva (PT).
A investigação aponta para a existência de uma “organização criminosa” dividida em vários grupos, com diversas ações planeadas, que envolveram inclusive planeja assassinar Moraes, Lula e o vice-presidente eleito Geraldo Alckmin (PSB).
A investigação revelou que toda a operação não foi adiante, entre outros motivos, pela falta de apoio de duas figuras-chave do militares brasileiros de alto escalão: General Marco Antonio Freire Gomes, comandante do Exército, e Tenente-Brigadeiro Carlos de Almeida Baptista Junior, líder da Aeronáutica.
O nome de Freire Gomes é citado 141 vezes no relatório da PF divulgado recentemente. Baptista Junior aparece em 48 trechos do texto.
“Depois de finalizar os termos do decreto [do golpe]o então presidente Jair Bolsonaro ordenou que os comandantes das Forças Armadas, almirante Garnier (Marinha), general Freire Gomes (Exército) e o ministro da Defesa, Paulo Sérgio, fossem chamados ao Palácio do Alvorada”, relata a PF.
“O objetivo naquele momento era obter o apoio dos comandantes, para que as Forças Armadas pudessem garantir a concretização do empreendimento criminoso. Os comandantes do Exército e da Aeronáutica eram contrários à adesão a qualquer plano que impedisse os legitimamente eleitos da posse do governo O Comandante da Marinha, Almirante Garnier, colocou-se à disposição para cumprir ordens”, acrescenta o texto.
Quem é o General Freire Gomes
Marco Antonio Freire Gomes nasceu em Pirassununga, interior de São Paulo, em 31 de julho de 1957.
Ele ingressou no exército no início dos anos 1980, quando se tornou aspirante a oficial de cavalaria.
O futuro general também atuou como instrutor na Academia Militar das Agulhas Negras (Aman), trabalhou como adido militar na Espanha e comandou o 1º Batalhão de Ações e Comandos, em Goiânia.
Como general, Freire Gomes foi secretário executivo do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), comandou a Brigada de Operações Especiais em Goiânia, chefiou a 10ª Região Militar, em Fortaleza, e assumiu o cargo de Comandante Militar do Nordeste.
Antes de comandar o Exército, chefiou o Comando de Operações Terrestres (Coter), considerado um dos cargos de maior prestígio do Exército Brasileiro.
Freire Gomes foi promovido a comandante do Exército por Bolsonaro em março de 2022 e ocupou o cargo até dezembro do mesmo ano. Ele substituiu o general Paulo Sérgio Nogueira, que deixou o cargo para assumir o Ministério da Defesa —e consta na lista de investigados da PF.
A investigação sobre a tentativa de golpe relata que o general teve uma postura “legalista” e mostrou “resistência” a qualquer tentativa de desrespeito ao resultado das eleições de 2022.
“Diante do cenário de resistência do General Freire Gomes, no dia 9 de dezembro de 2022, o então Presidente Jair Bolsonaro, após fazer alguns ajustes, ‘esfregando’ a minuta do Decreto, convocou o General Estevam Cals Theophilo Gaspar de Oliveira, comandante da Comando de Operações Terrestres – COTER para reunião no Palácio do Alvorada Na reunião, o general concordou em cumprir as determinações, relativas ao Golpe de Estado, caso ocorresse o golpe. Presidente da República assinou o decreto”, diz trecho da reportagem.
A resistência do comandante do Exército gerou pressões e ataques das chamadas “milícias virtuais”.
“Nesse contexto, Braga Netto [candidato a vice-presidente da chapa de Bolsonaro] ordenou que Ailton Gonçalves Barros dirigisse ataques pessoais (inclusive contra familiares) ao então comandante do Exército”, diz a PF.
Em depoimento obtido durante a investigação, Freire Gomes confirmou que foi pressionado diversas vezes para aderir ao plano golpista.
Ele ainda detalhou que participou de reuniões no Palácio do Alvorada após o segundo turno das eleições “nas quais o então presidente da República Jair Bolsonaro apresentou hipóteses de utilização de institutos jurídicos como Garantia da Lei e da Ordem (GLO), Estado de Defesa, Estado de sítio em relação ao processo eleitoral”.
Freire Gomes afirmou “que sempre deixou claro […] que o Exército não participaria da implementação desses institutos jurídicos destinados a reverter o processo eleitoral”.
Segundo depoimentos colhidos pela PF, Freire Gomes chegou a alertar o então presidente Bolsonaro que seria obrigado a prendê-lo caso continuasse com os planos de golpe de Estado.
Quem é o Brigadeiro Baptista Junior
Carlos de Almeida Baptista Junior nasceu em Fortaleza, Ceará, em 5 de setembro de 1960.
De família de militares — seu pai, o Tenente-Brigadeiro Carlos de Almeida Baptista, foi comandante da Aeronáutica de 1999 a 2003 — Baptista Junior estudou na Escola Preparatória de Cadetes do Ar, em Barbacena, Minas Gerais.
Ele foi promovido a tenente brigadeiro em março de 2018.
O site da Força Aérea Brasileira destaca ainda que Baptista Junior “tem 4 mil horas de voo, das quais 2.200 horas em caças”.
O militar assumiu a função de comandante da Aeronáutica em 12 de abril de 2021 e permaneceu no cargo até 2 de janeiro de 2023.
Citado 48 vezes no relatório da PF, Baptista Junior também rejeitou “qualquer apoio de suas forças na tentativa de golpe”.
Em declarações, ele afirma que tentou informar “constantemente” ao presidente Bolsonaro “que não houve fraude no sistema de votação eletrônica”.
Baptista Junior também confirmou que ele e Freire Gomes eram contra qualquer tentativa de ruptura institucional —enquanto o almirante Almir Garnier (comandante da Marinha) “se colocou à disposição”.
“O Brigadeiro Baptista Junior descreveu a dinâmica dos fatos, após o então Ministro da Defesa Paulo Sérgio apresentar o Decreto [relacionado ao golpe]. O depoente disse que fez ao ministro a seguinte pergunta: ‘Esse documento prevê que o novo presidente eleito não assuma o cargo?’.”
“Baptista Junior afirmou que, após sua pergunta, Paulo Sérgio permaneceu em silêncio, e diante disso entendeu que haveria uma ordem que impediria a posse do novo governo eleito. Defesa de que nem admitiria ter recebido o documento e que a Aeronáutica não admitiria golpe de Estado. Saiu então da sala.”
O tenente-brigadeiro detalhou que foi alvo de ataques e foi chamado de “traidor da pátria” e “melancia” —em referência a ser verde “por fora” (cor associada aos militares) e vermelho “por fora”. dentro” (uma cor associada ao comunismo).
Em trecho da investigação da PF, há indícios de que Braga Netto ordenou ataques direcionados à família do então comandante da Aeronáutica.
Em aplicativo de mensagens, Braga Netto escreveu: “Senta o pau no Baptista Junior […] traidor do país. A partir de então, a vida dele e de sua família se tornou um inferno.”
Baptista Junior disse que teve que suspender suas contas nas redes sociais — mas a pressão continuou mesmo assim.
“O depoente disse que no dia 08/12/2022, após a formatura dos aspirantes a oficiais da FAB, na cidade de Pirassununga/SP, foi questionado pela deputada federal Carla Zambelli com a seguinte pergunta: ‘Brigadeiro, o senhor não pode deixar o presidente Bolsonaro na mão’.”
“A depoente afirmou entender que a deputada estava propondo que ela aderisse a um ato ilícito”, revela o documento da PF.
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