O Senado pretende votar nesta quarta-feira (12/04) projeto de lei que legaliza cassinosbingos e Jogo do Bicho no Brasil, proposta que já foi aprovada pela Câmara em 2022.
A retomada da agenda ocorre num momento em que vício em games cresce no paísdepois da legalização sites de apostas esportivas e cassinos online.
Os críticos da proposta dizem que a legalização de mais actividades deste tipo irá agravar o problema e encorajar o branqueamento de capitais por parte do crime organizado.
Os defensores argumentam que não faz sentido permitir jogos online e abrir mão de atividades presenciais, que poderiam gerar mais empregos e receitas.
Dizem ainda que a proposta apresentada no Congresso traz regras para coibir a criminalidade e minimizar o vício.
O projeto tem apoio do governo de Luiz Inácio Lula da Silva (PT), com declarações favoráveis dos Ministérios das Finanças e do Turismo.
Também é visto com entusiasmo por membros do governo anterior, JairBolsonaro (PL), assim como o ex-chefe da Casa Civil, senador Ciro Nogueira (PP-PI).
Mas, tanto na esquerda como no campo bolsonarista, também há resistência.
A forte oposição do segmento evangélico é apontada como o principal fator que levou Bolsonaro a prometer vetar a proposta quando era presidente, caso ela fosse aprovada em votação. Congresso.
Lula disse que sancionará a lei caso ela seja aprovada. “Não sou a favor do jogo, mas também não acho que seja crime. Se o Congresso aprovar e for feito um acordo entre os partidos políticos e for aprovado, não há razão para não sancioná-lo”, afirmou. em entrevista à Rádio Meio, do Piauí, em junho.
“Agora, acho que não é isso que vai resolver o problema do Brasil. Essa promessa fácil de que vai gerar 2 milhões de empregos, que vai desenvolver, também não é verdade”, afirmou, na mesma ocasião.
A fala de Lula ocorreu logo após a aprovação da proposta na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) do Senado, em votação acirrada (14 votos a 12).
O texto agora será levado ao plenário após alguns meses de atividade reduzida no Congresso, por conta das eleições municipais.
“É uma coisa que já veio da Câmara, tem apoio do governo, apoio de diversos segmentos”, disse o presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), a jornalistas na semana passada.
“O Senado precisa decidir se aprova ou não. Por isso, vários senadores pediram, na reunião de líderes, que pudesse ser submetido ao plenário”.
Ainda no Senado, a CPI das Apostas, que investiga a manipulação de jogos e apostas esportivas, pediu a Pacheco que suspendesse a votação até que as apostas online sejam regulamentadas.
O requerimento, assinado pelo senador Eduardo Girão (Novo-CE), argumenta que as apostas esportivas têm causado prejuízos sociais e econômicos às famílias e aos setores produtivos.
Na terça-feira (12/3), véspera da votação, o pastor Silas Malafaia criticou a proposta em suas redes sociais.
“Estamos presenciando os prejuízos econômicos e sociais das apostas, dos jogos eletrônicos. Dinheiro tirado do consumo, da produtividade, para jogos. R$ 200 bilhões por ano para jogos”, atacou.
“O governo Lula, ávido por arrecadar receitas, está apoiando esse lixo. Queria informar que a arrecadação fica aquém dos prejuízos econômicos e sociais que os jogos de azar produzem”, continuou.
Malafaia é um dos pastores que assinou uma “carta de repúdio” ao projeto junto com outros pastores, entre eles Estevam Hernandes, da igreja Renascer em Cristo, considerando que a liberação dos jogos de azar produzirá “efeitos colaterais” preocupantes, entre eles “ dívida, vídeo, fraudes, lavagem de dinheiro e exploração de pessoas vulneráveis”.
O ministro do Turismo, Celso Sabino, por sua vez, afirma que dependentes químicos seriam proibidos de acessar cassinos.
“As pessoas que entrarem na área do casino serão identificadas, haverá controlo. Qualquer pessoa identificada com essa compulsão não poderá acessar as áreas”, afirmou em setembro, segundo a CNN Brasil.
Na ocasião, defendeu a instalação desses projetos em destinos turísticos com potencial para aumentar o atual número de visitantes, como Salinópolis e Alter do Chão, no Pará; Olímpia, em São Paulo; e Pirenópolis e Alexânia, em Goiás.
O que mudaria com a proposta?
Esse mercado vem se expandindo fortemente desde que os sites de apostas esportivas foram autorizados pelo Congresso a operar no país em 2018, durante o governo Michel Temer (MDB).
Esses sites funcionaram sem regulamentação por alguns anos, porque o governo Bolsonaro não quis tocar no assunto.
Durante o governo Lula, a regulamentação foi aprovada em 2023, com o objetivo de aumentar a arrecadação e criar regras para seu funcionamento. Foi nesse momento, com a aprovação da Lei das Apostas, que os casinos online também foram legalizados.
Os críticos, porém, dizem que são necessárias regulamentações mais rígidas para conter o vício, como restrições à publicidade.
Hoje, os sites de apostas patrocinam dezenas de clubes de futebol no Brasil, impactando até crianças e jovens.
Caso a nova proposta seja aprovada no Congresso, seria permitida a construção de cassinos físicos no país, em quantidades limitadas.
Os defensores da medida dizem que ela facilitaria a fiscalização, tornando mais difícil a sua utilização para lavagem de dinheiro.
O texto aprovado pela CCJ, que ainda pode ser modificado no plenário, autoriza cassinos em centros turísticos ou complexos integrados de lazer, como resorts e hotéis de alto padrão com pelo menos cem quartos, além de restaurantes e locais para eventos.
O limite seria de um cassino em cada Estado e Distrito Federal, com exceção de São Paulo (até três), e Minas Gerais, Rio de Janeiro, Amazonas e Pará (até dois cada), devido ao tamanho do população ou do território. Haveria também limites para casinos em navios, em rios e no mar.
O jogo de bingo seria lançado nos formatos cartão, eletrônico e vídeo bingo.
O texto prevê uma casa de bingo em cada município, cabendo às cidades maiores um estabelecimento para cada 150 mil habitantes.
Além disso, seria legalizado jogo de animaisatividade que hoje é contravenção praticada por organizações criminosas.
A disputa pelo controle territorial dos pontos de apostas já gerou diversas execuções no Rio de Janeiro.
O texto prevê que uma empresa para cada 700 mil habitantes de cada Estado e do Distrito Federal poderá ser credenciada para explorar o jogo do bicho. Roraima, único estado com população abaixo desse nível, só poderia ter uma empresa.
Novos impostos
A proposta prevê a criação de dois tributos sobre o setor, cuja arrecadação seria dividida entre União, Estados e municípios.
A Taxa de Fiscalização de Jogos e Apostas (Tafija) seria paga trimestralmente, no valor de R$ 600 mil para cassinos; R$ 300 mil para casas de jogos online; e R$ 20 mil para casas de bingo, operadoras de Jogo do Bicho e entidades de corrida.
A Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico incidente sobre a comercialização de jogos e apostas (Cide-Jogos) teria alíquota de até 17% sobre a receita bruta (diferença entre o valor das apostas e dos prêmios pagos) de todas as empresas do setor.
Parte dos recursos teria que ser destinada a ações de prevenção ao vício em jogos, saúde, segurança pública, proteção animal, financiamento estudantil, ações em áreas impactadas por desastres naturais e Fundo Nacional da Criança e do Adolescente.
Além disso, 1% da receita bruta do setor seria destinada à formação de atletas, por meio do Comitê Brasileiro de Clubes e do Comitê Brasileiro de Clubes Paralímpicos.
O apostador, por sua vez, pagará 20% de Imposto de Renda sobre ganhos acima de R$ 10 mil. O valor a ser tributado será o saldo entre os prêmios recebidos e os gastos com apostas nas últimas 24 horas.
Estimativas apresentadas pelo senador Irajá Abreu (PSD-TO), relator da proposta, indicam que a legalização das atividades poderá gerar investimentos de R$ 100 bilhões e criar cerca de 1,5 milhão de empregos diretos e indiretos.
A receita potencial seria de R$ 22 bilhões por ano, segundo o senador.
“Todos os países do OCDE [Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico] praticamente, quase todos os países do G20 e, olhando para o mundo, quase todos os países, mais de 90%, regulamentaram”, defendeu o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT), em julho, em vídeo gravado ao lado de Abreu e compartilhado no Instagram do senador.
“Desde que seja bem disciplinado, bem feito, moralizado, com fiscalização do Estado brasileiro e proteção aos cidadãos, é algo que pode gerar empregos e renda em nosso país.”
Críticas ao vício e à dívida
Em contraste com as promessas de receitas e empregos, os críticos dizem que o vício do jogo está a causar dívidas e perturbações familiares.
Em discurso no plenário do Senado, em julho, o senador Eduardo Girão citou as apostas feitas pelos beneficiários do Programa Bolsa Famíliaque movimenta R$ 3 bilhões por mês, segundo relatório do Banco Central.
Após a divulgação desses dados, o governo proibiu o uso do cartão do programa nas apostas online.
“Já temos R$ 100 do Bolsa Família [em média por mês] comprometido com as apostas esportivas”, criticou Girão.
“Quem recebe o Bolsa Família? São as pessoas, as famílias mais vulneráveis. E aí a gente vê esse tipo de inversão de valores no Brasil.”
A Confederação Nacional do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (CNC) afirma que o aumento das apostas está a atrair recursos que poderão ser utilizados para consumo.
“Cada venda perdida no varejo custa mais do que a venda em si. Porque há custos fixos que não mudam”, disse o economista-chefe da CNC, Felipe Tavares, em entrevista à Agência Brasil em setembro.
“Se você estava acostumado a ganhar R$ 1.000 por semana e, de repente, começa a ganhar R$ 500 por semana, o impacto é maior que R$ 500. Calculamos uma perda potencial de R$ 117 bilhões por ano se você continuar com essa escalada nas apostas gastos.”
Outros projetos tramitam no Congresso com o objetivo de endurecer as regras para apostas online. Propostas apresentadas por deputados petistas, entre eles Gleisi Hoffman, presidente do PT, tentam proibir a publicidade.
“A expansão apostas no país foi sustentado por uma avalanche de publicidade em todos os meios de comunicação, nos campos de futebol e nas camisas, nas redes sociais, que se utilizam de figuras públicas para divulgar seus jogos. Nem as crianças estão livres dessa manipulação”, diz a justificativa do projeto do deputado Reginaldo Lopes (PT-MG).
Em entrevista à BBC News Brasil em outubro o diretor do Departamento de Saúde Mental do Ministério da Saúde Sônia Barros também defendeu a proibição de propagandas de casas de apostas.
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