Brindes, ondas, uvas, resoluções, simpatias…A meia-noite do dia 31 de dezembro é muitas vezes um momento de esperança e equilíbrio para milhões de pessoas em todo o planeta.
Um ano “termina” e outro “começa” e, com ele, as aspirações por dias melhores e inúmeros propósitos e novos objetivos.
É o último dia de Calendário gregorianoos 365 dias convencionais (mais um em anos bissextoscomo foi 2024) que governou o Ocidente desde que o calendário juliano deixou de ser usado em 1582.
A virada dos acontecimentos celebra o fim de um ciclo que marcou o tempo de diversas culturas durante milênios: uma revolução completa da Terra em torno de sua estrela.
“O que tradicionalmente entendemos por ano, tanto em astronomia Como em muitas culturas, é o tempo que nosso planeta leva para girar em torno do Sol”, explica o astrônomo e acadêmico Eduard Larrañaga, do Observatório Astronômico Nacional da Universidade Nacional da Colômbia, à BBC News Mundo (serviço espanhol da BBC).
Porém, como também relata o físico teórico, a data em que começa e termina um ano não é baseada na Ciência — é, na verdade, uma convenção, ou seja, um sistema que, em última análise, é “inventado”.
“Assumir que o ano termina à meia-noite do dia 31 de dezembro e começa no dia 1º de janeiro é uma construção social, uma definição que foi feita num momento da história”, afirma.
Segundo Larrañaga, como a base para medir um ano é o tempo que a Terra leva para dar uma volta ao redor do Sol, a contagem de quando esse ciclo começa e termina pode ocorrer, na prática, a qualquer momento.
“Do ponto de vista astronómico, não acontece nada de especial no dia 31 de dezembro para dizer que é aqui que termina o ano, nem acontece nada de especial no dia 1 de janeiro para dizer que é aqui que começa”, explica.
“Na realidade, em toda a órbita da Terra não há nada de especial ou fora do comum que marque a mudança de um ano.”
Mas não para por aí.
A duração exata de 365 dias do ano (ou 366, no caso de anos bissextos) é outra convenção social.
“Na verdade, existem muitas maneiras de medir a duração de um ano”, diz Larrañaga.
E, dependendo da forma utilizada, a duração não é a mesma.
Mas como isso é possível?
A duração do ano
Desde que foi introduzido pelo imperador Júlio César em 46 a.C., o calendário juliano serviu para contar a passagem dos anos e a história da Europa até ao final do século XVI.
Porém, desde a Idade Média, vários astrônomos perceberam que esta forma de medir o tempo produzia um erro acumulado de aproximadamente 11 minutos e 14 segundos a cada ano.
Foi então que, em 1582, o Papa Gregório XIII promoveu a reforma do calendário que ainda hoje utilizamos, fazendo ajustes para melhorar o modelo introduzido por Júlio César, que já previa anos bissextos. Uma das mudanças instituídas pelo pontífice para lidar com o superávit acumulado foi deixar de fazer ano bissexto aquele que fosse divisível por 100, mas não por 400. Por exemplo, 2000 e 1600 foram anos bissextos, mas 1700 e 1900 não.
Larrañaga explica que, do ponto de vista da astronomia, base para definir o que é um ano, não existe uma unidade única de medida, mas pelo menos quatro para contar o tempo que a Terra leva para dar uma volta ao redor do Sol:
- Calendário anual ou juliano: “É uma convenção e é usada na astronomia como uma unidade de medida em que se considera que a Terra gira em torno do Sol em 365,25 dias.”
- Ano sideral: “É o tempo que a Terra leva para dar uma volta ao redor do Sol em relação a um sistema de referência fixo. Nesse caso, um grupo de estrelas é usado como referência e este ano dura 365,25636 dias.”
- Ano trópico: “Ele leva em consideração a longitude eclíptica do Sol, ou seja, o ângulo do Sol no céu em relação à Terra ao longo do ano, principalmente nos equinócios. E dura um pouco menos que o ano sideral, 365,242189 dias.”
- Ano anomalístico: “A Terra, assim como os demais planetas, se move em uma elipse. Essa elipse faz com que, em algumas ocasiões, o Sol fique cada vez mais próximo da Terra. Mas há um ponto em que ambos estão o mais próximos possível, chamado periélio. E o ano anomalístico é o tempo decorrido entre duas passagens consecutivas da Terra pelo seu periélio.
Embora Larrañaga indique que são todos da ordem de 365 dias, assumir que esta é a duração exata de um ano torna-se uma simplificação.
Mas também não leva outro fator em consideração.
“Há outra questão. É que, embora tenhamos estes cálculos, nem todos os anos duram a mesma coisa, não têm sempre a mesma duração”, afirma.
Influências externas
Segundo o especialista, embora os astrônomos tenham tentado calcular com precisão ao longo dos séculos o tempo que a Terra leva para dar uma volta ao Sol, há um problema básico que os impede de obter um número definitivo.
“Devemos levar em conta que a duração dos anos nunca é a mesma porque tudo muda no Sistema Solar. Tomemos o caso do ano anomalístico: à medida que a Terra gira em torno do Sol, o periélio muda como resultado da ação gravitacional de outros planetas, como Júpiter”, explica.
O físico teórico lembra que algo semelhante ocorre com o chamado ano trópico, que mede o intervalo de tempo entre duas passagens consecutivas do Sol pelo Ponto Áries ou pelo equinócio da primavera.
“O ano trópico também muda, pois depende do eixo da Terra, que é torcido. É como um pião. Então a data e a hora do equinócio também são diferentes”, afirma.
“E se compararmos quanto tempo durou o ano sideral em 2020 com quanto durou em 1300, certamente notaríamos uma diferença. Seria sempre em torno de 365 dias, mas não teria exatamente a mesma duração, porque o movimento da Terra nem sempre é o mesmo.”
Este texto foi publicado originalmente em 31 de dezembro de 2020 e republicado com atualizações em dezembro de 2024
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