O presidente do México, Claudia Sheinbaumapresentou um dos planos de desenvolvimento económico mais ambiciosos dos últimos anos para o seu país.
O anúncio ocorreu justamente num momento de grande incerteza para o México com a posse do novo presidente americano Donald Trumpqual acontecerá na segunda-feira (20/1).
Foi uma semana antes da mudança de poder em Washington que altos responsáveis governamentais e os principais diretores empresariais do país se reuniram na segunda-feira na Cidade do México, para ouvir os objetivos e estratégias apresentados pela própria presidente, numa cerimónia especial.
Um dos seus maiores objetivos é que a economia do México se torne a décima maior do planeta.
Sheinbaum pretende fazer com que o país produza 50% dos produtos consumidos internamente, criar 100 parques industriais para empregar milhares de pessoas e posicionar o país entre os cinco principais destinos turísticos do mundo.
“Que cada mexicano e cada mexicana saibam que existe um plano, que existe desenvolvimento. Que, diante de qualquer incerteza que possa surgir no futuro próximo, o México tenha um plano e esteja unido para avançar”, declarou.
O presidente não mencionou diretamente Donald Trump.
O secretário de Economia do México, Marcelo Ebrard, definiu o projeto como um “mapa de navegação do México para a nova era que enfrentaremos”.
“Nos meus 42 anos de serviço público nunca vi um instrumento igual”, destacou. “Há incertezas no futuro imediato, mas somos coesos e temos uma direção nacional que nos permitirá avançar.”
Analistas econômicos mexicanos comemoraram. O plano fornece objetivos claros e formas de alcançá-los, pelo menos na sua apresentação. Mas outros notaram a falta de voz e reconhecimento por parte do sector laboral e sindical.
O analista econômico Mario Campa, formado pelo Instituto Tecnológico Autônomo do México, disse à BBC News Mundo (serviço de língua espanhola da BBC) que, “pelo menos no papel, é a política industrial mais ousada das últimas quatro ou cinco décadas no México”. .” .
Por outro lado, o académico Carlos Pérez Ricart, do Centro de Investigação e Ensino Económico, destaca que esta “é uma boa resposta ao clima de incerteza vivido no país”. Mas considera que faltam detalhes sobre como atingir esse objetivo.
“É uma estratégia de desenvolvimento económico de médio e longo prazo, que visa enfrentar uma situação muito complexa, no meio de decisões internas, como a reforma do Poder Judiciário, e a eleição de Donald Trump”, explica.
Mas os dois especialistas concordam que o plano traz boas expectativas para o futuro do país no curto e médio prazo.
Os grandes objetivos
Durante a apresentação do chamado Plano México, o presidente listou 13 grandes metas e definiu prazos e ações governamentais para alcançá-las:
- Ser a décima maior economia do mundo. Atualmente, o México ocupa a 12ª posição em relação ao seu Produto Interno Bruto (PIB), segundo o Banco Mundial.
- Investimentos superiores a 25% do PIB. O governo e o setor privado devem atingir 30% de investimento em relação ao PIB até o ano de 2030.
- 1,5 milhão de empregos especializados. Criar empregos na indústria e em profissões especializadas.
- Aumentar a produção no México. 50% dos produtos consumidos no país devem ser fabricados no México em “setores estratégicos”, como tecidos, calçados e móveis.
- 15% dos produtos mundiais fabricados no México. Aumentar a participação mexicana nas exportações a nível global.
- Compras governamentais de fornecedores locais. O governo deve fazer metade das suas compras no mercado nacional.
- Vacinas mexicanas. Realizar todo o processo de fabricação de vacinas com “biotecnologia avançada” no país.
- Um ano de procedimentos para investir. Reduzir o prazo de processamento de novos negócios no país de dois anos e meio para um ano, reduzindo as exigências em 50%.
- Capacitar 150 mil técnicos e profissionais. A cada ano, aumentar em pelo menos 150 mil o número de pessoas formadas em “setores estratégicos”.
- Investimentos ecológicos. As indústrias devem manter políticas de reutilização, energia limpa e processamento de resíduos.
- Financiar 30% das pequenas e médias empresas. O governo e os bancos privados devem apoiar quase um terço das médias e pequenas empresas.
- Os 5 melhores turismo do mundo. Posicionar o país entre os cinco destinos mais visitados do planeta.
- Reduzir a pobreza e a desigualdade. Manter e expandir os 9,5 milhões de mexicanos que saíram da pobreza nos últimos seis anos.
Sheinbaum também apresentou uma lista de 15 datas-chave imediatas para implementação das novas ações, entre janeiro e abril deste ano.
“Saímos de uma época em que o planejamento não era necessariamente o eixo central de uma visão”, destacou.
Parte do equilíbrio necessário ao desenvolvimento geral do país, afastando-se do foco na região fronteiriça com os Estados Unidos, é a definição de 12 “Polos de Bem-Estar” – áreas estratégicas onde serão criadas indústrias, dependendo dos recursos locais.
“O objetivo […] é que todos nos juntemos a esta visão do nosso país, que façamos parte, cada um dos mexicanos e mexicanas, por mais diferenças que tenhamos, de uma visão de longo prazo do nosso país”, declarou o presidente. É para isso que serve. que estamos convidando a todos.”
Feito no México
O México é o principal parceiro comercial dos Estados Unidos. E a estratégia de industrialização de Sheinbaum é manter o país como fornecedor do grande mercado norte-americano.
Mas um dos principais destaques do Plano México é voltar a fabricar no país produtos que, nas últimas décadas, foram trazidos do exterior, principalmente da China.
Com o tempo, o país deixou de produzir o que consumia para importar produtos da Ásia. Atualmente, 10% das exportações chinesas têm como destino o México, segundo o secretário de Finanças mexicano, Rogelio Ramírez.
“Esta queda na participação custou-nos, especialmente ao México e aos Estados Unidos – os dois países com maior população e o Canadá com menor população –, muitas indústrias, muitos empregos, muita perda de atividade”, destacou. “Principalmente, setores inteiros da economia.”
Campa explica que o novo plano não prevê substituição de importações como no passado, quando havia outro contexto. Esta é uma nova aposta no mercado nacional.
A existência de um plano abrangente permite atingir objetivos como os apresentados, explica, mas a sua execução será fundamental.
“Parece-me ser um plano abrangente, pois aborda aspectos como tarifas específicas de importação, fundo de desenvolvimento para pequenas e médias empresas, investimentos em energia, investimentos mistos em infra-estruturas e logística, simplificação de procedimentos de investimento, aumento da quantidade de engenheiros, a parte fiscal que facilita o nearshoring (relocação), a construção de hubs com parques industriais e pesquisas científicas”, destaca Campa.
Mas o desenvolvimento social é fundamental e precisa acompanhar o plano. Afinal, mão de obra qualificada e aspectos básicos, como morar próximo ao trabalho, são essenciais para o bom desenvolvimento dos pólos industriais.
“Há casos de diretores de indústrias muito grandes que comentam o déficit habitacional, que provoca rotatividade de pessoal”, destaca. “E a mão de obra qualificada às vezes é subestimada, mas é muito importante porque evita a rotatividade.”
Pérez Ricart mostra-se cético quanto à disponibilidade de um orçamento em montantes suficientes para investimentos públicos da magnitude defendida por Sheinbaum.
“O plano é inovador porque apresenta um diagnóstico, metas claras e formas de atingir o seu objetivo. Há uma ideia de país”, destaca.
“Mas não está claro se será investido muito mais dinheiro do que já foi investido em tudo isso.”
E Trump?
O regresso de Donald Trump à Casa Branca, em 20 de janeiro, aumentou as expectativas sobre as suas futuras decisões políticas.
Pérez Ricart lembra que, diferentemente do primeiro mandato, o republicano não tem mais expectativas de reeleição. Portanto, suas políticas poderão ser mais agressivas, pois ele não tem medo de um voto de desaprovação caso algo dê errado em seu governo.
O México e o Canadá – dois vizinhos e parceiros comerciais dos Estados Unidos – já foram ameaçados com tarifas de importação devido a problemas como a migração ou o tráfico de drogas. E a reação dos dois países em relação a Washington também é motivo de expectativa.
Para Pérez Ricart, não existe nenhum plano que possa preparar o México para o que surgirá com a posse de Trump nos Estados Unidos.
“Não há receita nem resposta adequada a Donald Trump”, destaca. “Aqui ninguém tem a solução.”
“O presidente [mexicana] está fazendo o melhor que pode, dadas as circunstâncias. Mas a incerteza em termos de tarifas e intervencionismo é tão grande que nada pode ser planeado”.
Mario Campa também acredita que não há garantia de que o Plano México possa avançar conforme planejado. Mas considera-o um bom “instrumento de defesa e negociação” – especialmente as tarifas de importação que o México pretende impor a certos produtos industrializados da China, o que também é esperado de Trump.
“O protecionismo dos Estados Unidos veio para ficar por muito tempo e o México precisa deste tipo de projeto, como o Plano México, como uma opção ‘B’ de longo prazo”, conclui.
Análise de Daniel Pardo, correspondente da BBC News Mundo no México
Seja ou não uma resposta à eleição de Donald Trump, é inevitável entender a apresentação do Plano México exatamente como isso: um apelo à calma, um gesto de unidade nacional, um exercício de ordem e prudência face ao tempos turbulentos que podem estar à nossa frente. .
Claudia Sheinbaum demonstrou mais uma vez seu perfil acadêmico, rigoroso e meticuloso. A sua apresentação gera consenso sobre o seu diagnóstico e soluções, mas também cepticismo quanto à sua viabilidade.
Se houver alguma dúvida de que houve outro objetivo, além de definir os alicerces do futuro (como oferecer um golpe de opinião), cabe destacar que a apresentação aconteceu no majestoso pátio do Museu Nacional de Antropologia do México, um entidade que ensina a grandeza do país. Estiveram presentes importantes figuras empresariais, como Carlos Slim Domit, filho do homem mais rico do México, Carlos Slim Helú.
“O objetivo é fazer do México o melhor país do mundo”, anunciou o presidente. E há muitos mexicanos, ricos ou pobres, empresários ou trabalhadores, que acreditam que é possível atingir este objetivo.
O pessimismo alarmista gerado em 2016, com a primeira eleição de Trump, desta vez percorreu um longo caminho. A maioria dos mexicanos, mesmo confrontados com a ameaça dos impostos de importação e das deportações trumpistas, acreditam agora que o país está no caminho certo e que está em boas mãos.
Sheinbaum tem uma popularidade sem precedentes de 80%. É um índice invejável para qualquer presidente, atribuído ao seu perfil técnico e aos seus posicionamentos políticos.
O desafio agora será manter esse índice.
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