Lisboa — O primeiro-ministro de Portugal, Luís Montenegro, cumpriu exatamente o que havia prometido durante a campanha eleitoral: endureceu as regras de imigração no país. A partir de agora, as pessoas deixarão de poder entrar como turistas e viver ilegalmente em território português até obterem uma autorização de residência oficial. Para regularizar os documentos, bastava que as pessoas apresentassem uma manifestação de interesse, manifestando o desejo de viver em terras portuguesas. Esse mecanismo, criado em 2017 e utilizado principalmente por brasileiros, foi extinto. Os mais de 400 mil processos em andamento serão respeitados.
De acordo com as novas regras, detalhadas esta segunda-feira pelo ministro da Presidência, António Leitão Amaro, quem decidir efetivamente emigrar para Portugal para viver e trabalhar terá de solicitar um visto de trabalho nos consulados portugueses. No caso dos brasileiros e demais cidadãos da Comunidade dos Países de Língua Portuguesa (CPLP), haverá uma alternativa à manifestação de interesse, mas ainda não há detalhes sobre o instrumento, o que, segundo o ministro, será feito em breve. Existe um acordo de mobilidade entre Portugal e as ex-colónias que falam português.
O objetivo claro do Plano de Ação para as Migrações, composto por quatro eixos — imigração regulamentada, atração de talentos estrangeiros, integração humanista funcional e reorganização institucional — e 41 medidas é limitar, sobretudo, a entrada em Portugal de pessoas oriundas de países como como Índia, Paquistão, Bangladesh e Nepal. Estes cidadãos têm enfrentado uma onda crescente de xenofobia, alimentada, sobretudo, pela extrema direita. Os portugueses mais radicais atribuem a estes imigrantes o aumento da criminalidade, o que Montenegro nega, e afirmam que querem impor uma nova cultura no país, baseada no Islão.
A preferência do governo português por brasileiros e cidadãos de outros países da CPLP é reforçada noutra medida do plano migratório. As autorizações de residência emitidas através do acordo de mobilidade — a maior parte das quais já caducaram — serão renovadas por mais um ano, segundo o decreto a publicar até 30 de junho. Durante este período, os titulares destes títulos serão convocados pela Agência para a Integração, Migrações e Asilos (Aima) para recolha de dados biométricos. A autorização de residência deixará de ser impressa em papel A4 e será substituída por cartões que permitirão a livre circulação em todo o Espaço Schengen da União Europeia.
Pouco depois do anúncio do pacote de restrição à imigração, o presidente de Portugal, Marcelo Rebelo de Sousa, promulgou um decreto validando todas as medidas. Numa nota, destacou que, “tendo em conta a situação extremamente urgente de regularização de muitos milhares de processos de autorização de residência pendentes, respeitando as situações até à data existentes”, o pacote elaborado pelo governo, “evita sobrecarregar os processos de regularização em curso com novas manifestações de interesse, admitidas em legislação anterior”. O líder português espera que, com esta decisão, o Executivo resolva os mais de 400 mil casos pendentes de imigrantes que vivem em Portugal, a maioria dos quais são brasileiros.
Profissionais qualificados
Para Luís Montenegro, perante o caos que se instalou no processo migratório, o governo não teve outra alternativa senão apertar a regulamentação à entrada de estrangeiros no país. “Acabamos com alguns mecanismos que se transformaram num abuso excessivo da nossa disponibilidade para acolher. A circunstância de termos um procedimento segundo o qual uma simples manifestação de interesse é suscetível de facilitar e descontrolar a entrada de imigrantes em Portugal chegou hoje ao fim “, ressaltou. Na sua opinião, todos querem que Portugal tenha as portas abertas, mas não escancaradas.
O pacote de imigração envolverá o aumento de pessoal nos consulados dos países de língua portuguesa e da Índia. A Aima vai assumir o atendimento presencial a estrangeiros, função que tinha sido delegada ao Instituto dos Registos e do Notariado (IRN), a rede de cartórios notariais portugueses. Haverá também um reforço financeiro para o Observatório das Migrações que visa o regresso dos imigrantes em dificuldade aos seus países de origem, um maior apoio às associações de apoio aos estrangeiros e a implementação de uma unidade de fronteira na Polícia de Segurança Pública (PSP) para controlar quem entra e sai do país.
Portugal quer, com todas estas medidas, atrair profissionais mais qualificados e alinhados com as necessidades do país e promover a atração e frequência de estudantes estrangeiros em instituições de ensino superior — os brasileiros representam mais de 50% dos estudantes de mestrado e doutoramento no país. Atualmente, segundo o governo, quase 31% dos trabalhadores estrangeiros que vivem em território português têm baixas qualificações. Segundo dados preliminares de 2023, vivem em Portugal 1,04 milhões de imigrantes. Eles contribuíram, líquidos, para a Previdência Social, com 1,6 bilhão de euros (R$ 9,3 bilhões) no ano passado.
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