Thomas Jefferson definiu Os Artigos Federalistas sobre a Constituição dos Estados Unidos como “o melhor comentário sobre os princípios de governo que já foi escrito”. No Brasil, o sistema defendido pelos federalistas influenciou Ruy Barbosa na elaboração da Constituição Brasileira de 1891, e continua a ser o eixo de gravidade do nosso regime republicano. Fora desse eixo nunca houve nada de bom.
Tem tudo a ver com o imbróglio entre Executivo, Legislativo e Judiciário em torno das emendas parlamentares ao Orçamento da União. O impasse criado com a suspensão do pagamento de emendas obrigatórias do ministro Flávio Dino, por falta de transparência, referendada por unanimidade pela Corte, provocou a reunião realizada nesta terça-feira entre os 11 ministros do Supremo; os presidentes da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG); e os ministros da Casa Civil, Rui Costa, e das Relações Institucionais, Alexandre Padilha, que buscam um acordo para restabelecer a execução das emendas que respeite as prerrogativas de cada um.
Os Papers são uma série de 85 artigos escritos para defender a ratificação da Constituição dos Estados Unidos, em reuniões ocorridas na Filadélfia em 1787, que foram publicados em quatro jornais nova-iorquinos e posteriormente reunidos no livro O Federalista (Editora Líder). Seus autores foram Alexander Hamilton, que escreveu 51 artigos; James Madison, 29; e John Jay, cinco. Escolheram o pseudônimo Publius, uma referência a Publius Valerius Publicola, estadista romano do século VI a.C., famoso por seu republicanismo. Público significa amante do povo.
O primeiro ensaio que nos interessa é o 51, de Madison, sobre os freios e contrapesos da Constituição americana, no qual afirma que é necessário dotar cada um dos Poderes — Executivo, Legislativo e Judiciário — dos meios constitucionais e motivações pessoais necessários. para que resista às intrusões dos outros. Medidas de defesa compatíveis com ameaças de ataque: “A ambição deve ser usada para neutralizar a ambição”.
Madison argumenta: “Se os homens fossem governados por anjos, os controles internos e externos do governo seriam dispensados. Ao estabelecer um governo – composto por homens que terão autoridade sobre outros homens – a grande dificuldade reside em. o governante controla os governados e, em seguida, obriga-o a controlar-se. Deste raciocínio surge o sistema de freios e contrapesos do nosso sistema presidencial, consagrado na Constituição de 1988. Segundo Madison, a autoridade legislativa predomina necessariamente num governo republicano. não é possível atribuir a cada um dos ramos do poder igual capacidade de autodefesa.
“Como a importância da autoridade legislativa leva a tal divisão, a fraqueza do Executivo, por sua vez, pode exigir que este seja fortalecido. Um direito absoluto de veto sobre o Legislativo parece, à primeira vista, ser o instrumento natural com o qual o Executivo deve estar armado, mas isso talvez não seja totalmente seguro nem apenas suficiente. Em situações normais, o veto pode ser exercido sem a firmeza necessária e, em situações extraordinárias, com perfídia abusiva”, destaca Madison. É aqui que o Judiciário entra em cena.
Transparência
Hamilton retoma essa discussão no ensaio 78, intitulado Juízes como guardiões da Constituição. É uma boa referência para o papel do Supremo Tribunal Federal (STF) nessa disputa entre o Executivo e o Legislativo pela execução das emendas parlamentares, que retiram R$ 33,6 bilhões do orçamento discricionário do governo e se tornaram uma grande caixa preta .
“O Executivo dispõe não só das honras, mas também da espada da comunidade. O Legislativo, além de controlar os gastos do Tesouro, prescreve as regras que devem reger os direitos e deveres de cada cidadão. espada ou do tesouro; ele não participa da força ou da riqueza da sociedade e não toma resoluções de qualquer natureza.”
Por isso, Hamilton defende a competência do Judiciário “para declarar nulos determinados atos do Legislativo, por serem contrários à Constituição”. Ele considerou falso o argumento de que isso seria uma superioridade de um poder sobre outro. “Não há posição que se baseie em princípios mais claros do que a de declarar nulo o ato de autoridade delegada que seja contrário ao conteúdo da delegação sob a qual tal autoridade é exercida”, argumentou.
Esta é a questão que está em jogo no caso de alterações tributárias que contrariam o princípio constitucional da transparência nos gastos públicos. Não por acaso, após quatro horas de reunião, os ministros do STF, os presidentes do Senado e da Câmara e representantes do governo Lula chegaram a um consenso sobre o pagamento das emendas ao Orçamento da União: as emendas “devem respeitar critérios de transparência, rastreabilidade e correção”.
Foi estabelecido um prazo de 10 dias para que os poderes Executivo e Legislativo regulamentem o tema. Enquanto isso, continua em vigor a decisão que suspende o pagamento das emendas, tomada pelo ministro Flávio Dino e posteriormente confirmada pelo plenário do STF.
Segundo o presidente da Corte, Luís Roberto Barroso, o tema mais problemático foram as “alterações do Pix”, que envolviam um repasse de recursos para um destino livre de apresentação de plano de trabalho. “Decidimos que não pode permanecer”, disse ele.
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