A empresa de acesso à internet via satélite Starlink, do bilionário sul-africano Elon Musk, recorreu ao Supremo Tribunal Federal (STF) contra a decisão do ministro Cristiano Zanin de manter o bloqueio das contas bancárias da empresa no Brasil. Representantes da Starlink formalizaram pedido para que o magistrado reconsidere a suspensão, sob o argumento de que a restrição de valores foi imposta sem o amplo direito de defesa.
As contas foram bloqueadas por ordem do ministro Alexandre de Moraes para garantir o pagamento de multas aplicadas à rede social X (antigo Twitter), que somam mais de R$ 18 milhões. O juiz considera que as duas empresas fazem parte do mesmo grupo económico liderado por Musk.
Apesar do recurso ao STF, a empresa informou que não cumpriria a ordem da Justiça de suspender o acesso ao X. Na tarde de ontem, a 1ª Turma do STF decidiu manter a decisão de Moraes de bloquear o acesso à plataforma no Brasil. Os membros do colegiado também seguiram o entendimento do relator de manter a aplicação da multa de R$ 50 mil para pessoas e empresas que utilizem rede privada, como VPN, ou outros “subterfúgios tecnológicos” para acessar a rede social de Musk durante o período de bloqueio. .
A decisão é válida até que X cumpra as decisões judiciais, pague as multas impostas e nomeie um representante legal no Brasil. Desde o início do ano, Elon Musk, dono da rede, descumpriu ordens do Supremo para bloquear perfis de pessoas investigadas pela Justiça, acusadas de atos antidemocráticos e ataques às instituições brasileiras. O empresário também fechou o escritório da empresa no Brasil e não designou um representante legal para representar a empresa no país, como exige a legislação brasileira.
Na sexta-feira da semana passada, a Starlink solicitou a liberação, mas teve o pedido rejeitado por Zanin. O ministro entendeu que o mandado de segurança —instrumento utilizado pela empresa— não pode ser apresentado para contestar decisão de outro membro do Tribunal.
No recurso formal de ontem, a empresa tenta, mais uma vez, reverter a decisão individual de Moraes. A empresa insiste que o bloqueio de ativos financeiros viola garantias constitucionais e que a Starlink não faz parte do processo contra o devido processo legal, e, por sua vez, todas as garantias necessárias à sua defesa”, argumentam os advogados da Starlink.
A empresa oferece conexão à internet via satélite e possui 224.458 acessos de banda larga fixa, segundo dados da Agência Nacional de Telecomunicações (Anatel). Apesar de pertencer ao bilionário, é apenas a 16ª maior operadora do setor no mercado brasileiro, e tem apenas 0,5% de participação na área, muito atrás de gigantes do setor, como Claro (20,4%), Vivo ( 14,2%) e Oi Fibra (9,3%).
Ao determinar o bloqueio da rede social, Moraes destacou o “descumprimento reiterado, consciente e voluntário de ordens judiciais e descumprimento das multas diárias aplicadas, além da tentativa de não submissão ao ordenamento jurídico e ao Judiciário brasileiro, estabelecer um ambiente de total impunidade e ilegalidade nas redes sociais brasileiras, inclusive durante as eleições municipais de 2024”.
A ordem de Moraes recebeu o apoio do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Ele disse que a determinação de banir X do Brasil é um sinal importante de que “o mundo não é forçado a aturar a extrema direita de Elon Musk, vale tudo só porque ele é rico”. A declaração foi dada à CNN Brasil. Na entrevista, Lula minimizou os danos que a determinação pode causar aos usuários e disse que milhões de pessoas buscam alternativas à rede.
“Medida necessária”
Os votos dos ministros enviaram mensagens importantes às bigtechs. Eles destacaram princípios constitucionais para manter a decisão de Moraes e reiteraram que as empresas devem estar sujeitas à legislação brasileira se quiserem operar no país. Primeiro a acompanhar o voto do relator, Flávio Dino afirmou que a manutenção do bloqueio da rede é uma questão de soberania nacional. “O arcabouço normativo da nossa Nação exclui qualquer imposição estrangeira, e são os Tribunais do Brasil, tendo o Supremo Tribunal Federal como órgão máximo, que estabelecem a interpretação das leis aqui vigentes”, afirmou.
Dino destacou que, para as empresas operarem no Brasil, é necessário cumprir as leis do país. “No mundo de hoje — mediado pelas tecnologias de informação e comunicação — a função de concretização de direitos depende decisivamente do controlo sobre estes novos intermediários privados. Desta forma, são destinatários incontornáveis da atenção da dimensão jurisdicional do Estado soberano”, apontou. .
O ministro Cristiano Zanin afirmou que “o reiterado descumprimento de decisões do Supremo Tribunal Federal é gravíssimo para qualquer cidadão ou pessoa jurídica. Ninguém pode pretender desenvolver suas atividades no Brasil sem observar as leis e a Constituição Federal”, disse. .
A ministra Cármen Lúcia destacou que a Constituição brasileira deve ser cumprida. “É grave, é grave e foi necessária, como ficou demonstrado na decisão e no voto do ministro relator, a medida judicial adotada. Nem o juiz deve julgar voluntariamente nem o indivíduo pode considerar-se mais soberano do que a soberania por si só. vontade de um povo, que é criada e construída de acordo com a lei que ele cria, impõe e cumpre”, afirmou.
O ministro Luiz Fux acompanhou o voto de Moraes, mas fez ressalva. Ele destacou que a suspensão da rede é válida, desde que “não afete indiscriminadamente pessoas físicas ou jurídicas e que não tenham participado do processo”, exceto no caso de “utilização da plataforma para fraudar esta decisão, com manifestações proibidas pela ordem constitucional, como expressões que revelem racismo, fascismo, nazismo, obstruam investigações criminais ou incitem crimes em geral”.
Em São Paulo, o presidente do Tribunal, Luís Roberto Barroso, defendeu que a plataforma cumpre ordens judiciais brasileiras. Ele chamou o comportamento do proprietário do X de “inaceitável”. “Já reiterei a posição de que uma empresa de comunicação, uma plataforma digital para operar no Brasil, como em qualquer país do mundo, precisa ter representação, precisa cumprir ordens judiciais e caso não concorde, recorrer dessas ordens judiciais “, disse Barroso.
A afirmação foi feita após o ministro participar de evento na Faculdade de Direito da USP. “A atitude de retirar representação para não ter que cumprir ordens sociais e não ter que observar a legislação brasileira é um comportamento que não seria aceitável em nenhum lugar do mundo”, acrescentou.
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