A lei que torna a violência política baseada no género um crime já existe há três anos, mas ainda é um desafio para as autoridades, especialmente durante as eleições. O tema foi lembrado pela presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministra Cármen Lúcia, no Dia Internacional da Democracia, comemorado ontem. Segundo ela, as mulheres têm “pouco o que comemorar”.
Segundo dados do Tribunal, dos 155,9 milhões de eleitores, 81,8 milhões são mulheres, o que representa 52%. Porém, das 462 mil candidaturas deste ano, apenas 34% são delas: 158 mil. Atualmente, existem 674 prefeituras com administração feminina, entre mais de 5,5 mil municípios brasileiros.
Por se tratar da primeira eleição municipal desde a criação da lei, o Grupo de Trabalho do Ministério Público Federal (MPF) informou que acompanha mais de 200 denúncias de violência política de gênero em todo o país. O órgão também encaminhou cerca de 50 representações para análise dos procuradores eleitorais regionais para possíveis providências. Pelo menos 18 queixas foram apresentadas em tribunal contra os agressores.
Na semana passada, em sessão no Supremo Tribunal Federal (STF) — Cármen Lúcia é a única mulher entre os 11 juízes —, a ministra afirmou que, no Brasil, “não existe democracia de gênero” e “democracia de cor”. “Nós, mulheres brasileiras, temos muito pouco o que comemorar. Não existe democracia de gênero, não existe democracia de cores. Existe uma guerra real. E contra as mulheres, de uma forma muito especial”, disse ela.
O juiz afirmou que houve cinco tentativas de assassinato de candidatos nas eleições municipais. “É uma intimidação violenta, feroz e cruel, que se intensificou nos últimos dias”, disse ela. “Quando uma mulher é estuprada, ela é assassinada, ela é estuprada, ela é assediada, todas nós, mulheres do mundo, somos. Ninguém corta o rosto de uma mulher só. Cortam o rosto de todas as mulheres do mundo”, destacou.
A advogada Michelle Heringer, especialista na gestão e combate ao assédio e à discriminação no trabalho, destacou que as agressões não são apenas físicas, mas também psicológicas —que visa deslegitimar, desqualificar e silenciar as vozes femininas no cenário político.
“Nos ambientes políticos, também é comum que as mulheres enfrentem assédio e discriminação sexual e moral. Esta forma de violência é utilizada como tática para desestabilizar e desmotivar as mulheres que procuram exercer influência ou poder político”, afirmou.
Segundo a especialista, a violência de gênero é um problema complexo que afeta tanto a política quanto qualquer outro espaço em que as mulheres busquem se inserir.
“Silenciado”
“A intersecção entre estas esferas reflecte e amplifica as desigualdades de género existentes. Para abordar eficazmente esta questão, é necessário um esforço coordenado que inclua mudanças nas normas sociais e culturais, melhorias nas políticas e práticas institucionais, e um compromisso contínuo com a justiça e a igualdade”, destacou Heringer.
A vice-presidente da Ordem dos Advogados do Brasil do Distrito Federal (OAB-DF), Lenda Tariana, destacou que a violência política de gênero desrespeita o princípio fundamental da igualdade e da diversidade na política, além de comprometer a democracia.
“Quando as mulheres são impedidas de exercer os seus direitos políticos com segurança, toda a sociedade perde, pois as suas vozes e perspectivas – fundamentais para o desenvolvimento de políticas públicas mais justas e inclusivas – são silenciadas”, afirmou.
Segundo ela, um dos maiores desafios é construir um ambiente seguro para que as mulheres possam concorrer a cargos públicos, participar de debates políticos e agir sem medo de retaliações. Ela destacou a responsabilidade das instituições neste processo.
“A OAB, como instituição defensora do Estado Democrático de Direito, pode e deve assumir uma postura firme contra qualquer forma de violência que ameace a participação de grupos historicamente marginalizados na política, incluindo as mulheres, e promover o desenvolvimento de políticas para proteger estes candidatos”, disse Lenda Tariana.
Iniciativas
Em 2021, foi sancionada a lei que alterou o Código Eleitoral e tornou crime a violência política de gênero. A legislação estabelece normas legais para prevenir, reprimir e combater a violência política contra as mulheres em espaços e atividades relacionadas com o exercício dos seus direitos políticos.
Considerada a primeira lei sobre violência política, define que “qualquer ação, conduta ou omissão com a finalidade de prevenir, obstruir ou restringir os direitos políticos das mulheres” representa violência política contra as mulheres. A norma também garante a participação das mulheres nos debates eleitorais e criminaliza a divulgação de fatos ou vídeos com conteúdo inverídico durante a campanha eleitoral.
Na semana passada, no plenário do TSE, Cármen Lúcia criou o Observatório dos Direitos Políticos Fundamentais da Mulher. As atividades do observatório serão divididas em três áreas: direitos políticos e eleitorais; direitos à privacidade e igualdade contra a violência digital; e direitos políticos fundamentais à igualdade de oportunidades para que as mulheres sejam social e politicamente capazes de exercer as suas prerrogativas de nacionalidade e cidadania plena.
A advogada Jéssica Marques, especialista em direito penal, lembrou que a imunidade parlamentar gera situações de violência e preconceito. Ela ressalta que o direito não é absoluto. “Temos cotas, uma lei de combate à violência política contra as mulheres, mas ainda existe uma imunidade parlamentar que dificulta a responsabilização dos potenciais agressores”, afirmou.
Segundo ela, muitos agressores se escondem atrás do seu papel para cometer flagrantes violências morais e psicológicas contra as mulheres. “Não há dúvida de que há necessidade de priorizar a conscientização da população com medidas preventivas para combater a violência contra a mulher em qualquer camada da sociedade”, acrescentou Marques.
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