A disputa entre Ricardo Nunes (MDB) e Guilherme Boulos (PSol) no segundo turno da eleição para prefeito de São Paulo traz de volta à arena política a polarização política e seus principais antagonistas: Jair Bolsonaro e Luiz Inácio Lula da Silva. Se o ex-presidente continuou com medo de pular de cabeça na reeleição de prefeito — quem realmente impulsionou foi o governador Tarcísio de Freitas —, o presidente só apareceu nas horas finais ao lado de seu candidato — fez uma transmissão ao vivo na sexta-feira, feira, e uma marcha com Boulos, no sábado, horas antes da votação.
A postura de Lula e Bolsonaro terá que mudar para este segundo turno. O horário eleitoral livre nas rádios e TVs, que começa amanhã, será rigorosamente dividido entre os dois candidatos, o que reduz significativamente o tempo de comparecimento de Nunes em relação ao primeiro turno.
Havia, no entanto, sérias dúvidas sobre se a polarização se materializaria. Não só porque as pesquisas de intenção de voto deram empate triplo entre Nunes, Boulos e Pablo Marçal (PRTB), mas porque, ao final da apuração dos votos, a distância entre eles era próxima em termos percentuais. O prefeito fechou o primeiro turno com 29,48% dos votos, enquanto o deputado federal obteve 29,07%. O influenciador digital conquistou 28,14% do eleitorado —no início da apuração chegou a liderar a disputa.
No discurso que fez após o encerramento da investigação, Nunes mostrou que, ao seu lado, foi construído um arco de alianças da centro-direita à extrema-direita. Eles foram ladeados pelo prefeito Tarcísio e pelo presidente do PSD, Gilberto Kassab —cujo partido tem cargos no governo Lula. O governador representou não apenas o bolsonarismo, mas, sobretudo, a si mesmo, como maior fiador da reeleição do prefeito. E, por conta disso, recebeu um agradecimento especial de Nunes.
“Tarcísio nos ajudou muito antes das eleições. Ele tem sido um grande irmão, nos ajudou muito no trabalho que realizamos na Prefeitura. avançar muito, e isso fez com que a nossa avaliação do governo fosse maior. Teve esse começo, lá atrás, onde a gente conversava todos os dias. Essa harmonia, essa união de trabalho entre o estado e a Prefeitura, era de. importância fundamental para desenvolvermos tantos projetos”, agradeceu.
Ao lado de Alexandre Ramagem (PL), derrotado por Eduardo Paes (PSD), no Rio de Janeiro, Bolsonaro disse que agora vai focar nas eleições paulistas. Isso porque o vice-prefeito é o coronel reformado da Polícia Militar Ricardo de Mello Araújo, que também é do PL.
“Agora, em São Paulo, é hora de abrir o jogo. Vou entrar de cabeça”, garantiu o ex-presidente.
Boulos, por sua vez, aproveitou a entrevista coletiva que concedeu após o término da apuração dos votos para acentuar a polarização política, que tem tudo para dar o tom deste segundo turno. Ele ressaltou que Nunes era candidato de Bolsonaro e ainda lembrou que o prefeito abraçou alguns discursos do ex-presidente — como questionar a eficiência da vacina contra a Covid-19 e que o dia 8 de janeiro de 2023 não foi uma tentativa de golpe de Estado.
“Ele é um candidato que, no primeiro turno, foi contra a vacina, um candidato que acredita que o 8 de janeiro foi apenas um encontro de senhoras, e não uma tentativa de golpe. Temos o presidente Lula e o vice-presidente Geraldo Alckmin do outro lado , temos alguém com uma trajetória muito suspeita. Alguém que tem histórico de relações com o crime organizado, com o tráfico de drogas”, acusou.
Passivos
Nunes chega ao segundo turno com algumas dúvidas para dirimir entre os eleitores. Um deles tentou desfazer ontem, no discurso: estava ao lado do filho e da esposa, Regina, e, em determinado momento, chegou a beijá-la. A autarca foi insistentemente solicitada por Marçal a explicar os motivos pelos quais apresentou uma denúncia de violência doméstica —o que ele nega, mas o documento, de facto, existe.
Outra explicação que Nunes terá de dar é sobre a chamada “máfia da creche”. Ele é alvo de um pedido da Polícia Federal (PF) à Justiça para abertura de inquérito específico porque acabou se beneficiando de um esquema que teria gerado R$ 1,5 bilhão entre 2016 e 2020. O dinheiro foi repassado por meio de suposta fraude em contratos superfaturados e faturas frias.
Nunes também terá que explicar a contaminação do transporte público paulista por figuras ligadas ao Primeiro Comando da Capital (PCC). A Prefeitura retirou de circulação as empresas de ônibus Transwolff e UPBus, alvos de uma operação do Ministério Público de São Paulo (MP-SP) por suspeita de serem “lavanderias” de dinheiro sujo arrecadado pela facção criminosa. A acusação contra Nunes é que ele hesitou em revogar as duas concessões, o que ele nega.
Em relação a Boulos, a questão continua sendo tornar-se mais palatável aos eleitores que o consideram um radical de esquerda, que invade propriedades alheias. Para o candidato do PSol, o desafio é conquistar votos da classe média e da elite paulista, já que a tendência é que os dados a Marçal migrem para Nunes.
Além disso, uma necessidade já detectada pela campanha é que Lula esteja mais presente ao lado de Boulos. Isto sentiu-se até pela avaliação que fizeram do resultado da votação, em que foi numericamente muito ameaçado por Marçal.
Para piorar a tarefa de Boulos, todas as pesquisas de intenção de voto no primeiro turno mostraram que, se ele fosse para o segundo turno contra Nunes, o prefeito seria o vencedor da disputa pela Câmara Municipal. A única chance de vencer seria uma luta contra Marçal.
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