A crise gerada pelo apagão em São Paulo tornou-se mais um capítulo da ofensiva do governo contra as agências reguladoras. O episódio colocou em xeque o trabalho da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), responsável pela fiscalização da distribuidora Enel, e levantou a possibilidade de revisão da atuação dos órgãos criados na década de 1990, que hoje possuem autonomia. O governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva articula um projeto, que será submetido ao Congresso, prevendo alterações nos mandatos dos diretores, para reformular a estrutura e o funcionamento. A medida é vista com preocupação e pode ser um tiro no pé. Em entrevista com CorrespondênciaO especialista em contratos públicos Fernando Vernalha alertou que uma maior interferência política nos órgãos pode causar insegurança jurídica e acabar desestimulando investimentos no país. “Dependendo de como for concebida essa mudança legislativa, isso poderia, de fato, prejudicar a agenda de investimentos no setor de infraestrutura, algo que poderia prejudicar o próprio governo”, pondera. Professor, advogado e consultor na área de direito público, é sócio fundador de Vernalha Pereira. Doutor e mestre em direito estadual, possui ampla experiência na estruturação de projetos de concessões e parcerias público-privadas (PPP’s). Sobre um possível processo de caducidade da Enel, afirmou que a medida drástica leva tempo, e uma resolução só poderá ser alcançada perto do fim do contrato com a concessionária, que termina em 2028. Vernalha também avalia a necessidade de adequação dos contratos públicos às mudanças climáticas.
Confira os principais trechos da entrevista:
Com o caso da Enel em São Paulo, fala-se muito no vencimento da concessionária, algo inédito no país. Como esse processo ocorre?
A caducidade é a medida mais drástica que pode ser tomada na execução de um contrato de concessão, porque significa a rescisão do contrato, devido a erros graves cometidos pelo operador. No caso do setor elétrico, essa medida é um ato decretado pelo poder concedente, no caso, pela União, mas quem inicia o processo é a agência reguladora, a quem compete fazer toda a análise do factos e a gravidade do incumprimento. das obrigações impostas à concessionária. Não é trivial, não é um processo simples, é um processo que leva tempo, é possível produzir provas e discutir a extensão da descoberta contratual, o que envolve análise dos fatos. No caso da Enel, o contrato data de 1998 e terminará em 2028. Portanto, é um contrato que já está em fase final, a poucos anos do encerramento natural. O início de um processo de caducidade neste momento levará algum tempo, pelo que o efeito prático disto pode não ser relevante, no sentido de que a eventual rescisão do contrato por caducidade ocorreria pouco antes do fecho da transação. Isso precisa ser lembrado.
Quais os impactos da revogação da concessão? Poderá isto ter um custo elevado para a União?
Caso a concessão termine antes do seu prazo natural, a União poderá precisar compensar. Neste caso, a União compensará a concessionária pelos investimentos que realizou e que não puderam ser totalmente amortizados. No caso de caducidade, a compensação não é necessariamente anterior ao encerramento ou transferência do serviço para o novo operador, mas a União tem que fazer esse levantamento e eventualmente terá que compensar a concessionária.
Que outras medidas podem ser tomadas?
Além da aplicação de multas, há outra medida também, que é o decreto de intervenção. Quando isso acontece, os diretores da empresa são destituídos e um interveniente é nomeado pelo governo, que por um período exerce o controle da operação. O papel do interveniente é corrigir as falhas e depois devolver o controle da operação aos diretores do concedente. É também uma medida extrema e, assim como a caducidade, são necessárias falhas gravíssimas para autorizar uma intervenção, mas é uma alternativa prevista na legislação.
Quais as falhas contidas no contrato com a Enel e o que precisa ser mudado diante deste cenário de aumento de eventos climáticos extremos?
Esse contrato da Enel foi criado no final da década de 90, é de outra geração de contrato de concessão. Atualmente, temos contratos muito mais bem desenhados e modernos, que já possuem uma distribuição de riscos muito mais específica e detalhada. Nesse contexto, não havia tanta preocupação com a atribuição de riscos e responsabilidades como existe nos contratos mais recentes. Os contratos actuais precisam de ter uma regulamentação mais específica relativamente à resiliência climática e à distribuição de riscos entre as partes, incluindo riscos relacionados com eventos climáticos. É necessária uma delimitação mais objectiva de responsabilidades. Quando o contrato é vago na atribuição de riscos e responsabilidades, logicamente, abre a porta a dúvidas e disputas em torno da delimitação das responsabilidades do operador.
Com o caso Enel, a briga entre governo e agências reguladoras ganhou força. O governo estaria inclusive articulando um projeto para aumentar o controle sobre essas autoridades, que têm autonomia garantida. Como você avalia isso?
Vejo esta iniciativa com muita preocupação. Fator que é muito importante nos setores regulados, para termos segurança jurídica e políticas regulatórias de longo prazo, políticas regulatórias ou regulação técnica e independente, é importante que as agências reguladoras tenham relativa independência do Poder Executivo. Precisamente para garantir que esta regulação seja orientada por conceitos técnicos e não políticos, e que seja uma regulação que sobreviva a longo prazo. É claro que pode haver adaptações regulatórias ao longo do tempo, mas não podemos ter uma regulamentação suscetível a mudanças como resultado da mudança de governos. Uma regulamentação que obedece a uma política de Estado e não a uma política governamental. Esse é um fator muito importante para criarmos um ambiente de segurança jurídica com estabilidade regulatória para atrair investimentos.
Quais os riscos dessa interferência política nas agências reguladoras?
Para que o programa de concessões para os seus diversos sectores se desenvolva, é muito importante que exista uma regulamentação técnica e relativamente independente. Dependendo de como for concebida esta mudança legislativa, isso poderá, na verdade, prejudicar a agenda de investimentos no setor de infraestrutura, o que poderá prejudicar o próprio governo. O investimento em infraestruturas é extremamente relevante na situação atual. Nos últimos anos não conseguimos ultrapassar o patamar de 2% do PIB (Produto Interno Bruto) em investimentos em infraestrutura e precisamos chegar entre 4% e 5%, que é a média dos países em comparação ao Brasil.
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