Nos últimos três anos, o Brasil recuperou as boas taxas de crescimento de que desfrutava no passado. Como consequência disto, o desemprego manteve-se em níveis historicamente baixos e a pobreza diminuiu. Como dizem os americanos: até agora, tudo bem.
Mas, em contraste com esta situação muito positiva, o clima nos mercados financeiros raramente foi tão sombrio. Ultimamente, as expectativas do mercado financeiro em relação às variáveis mais relevantes da economia têm-se revelado muito erradas. Em artigo recente, o ex-diretor do Banco Central, Luiz Eduardo de Assis, lembrou que, no início do ano, o Boletim Focus — que reúne previsões de 140 instituições financeiras — previa que o PIB cresceria em 2024, 1,5%, quando, na realidade, já sabemos que a economia crescerá mais que o dobro disso, 3,4%.
O Focus, em tom mais otimista, previu que o dólar fecharia o ano em R$ 5, mas fechará acima de R$ 6 e a taxa Selic, no final do ano, seria de 9%, quando sabemos que isso irá encerrar o ano em 12,25%. Os mercados também erram para o lado do otimismo.
Os estados de espírito dos mercados financeiros sempre influenciaram o clima da economia e condicionaram a ação governamental. Os governos que dependem da dívida pública para funcionar, como acontece com todos os Estados modernos, têm de ouvir não só a opinião dos cidadãos, mas também a opinião dos seus credores, aqueles que compram e vendem os seus títulos de dívida. Os governos que sonham libertar-se das pressões do mercado precisam primeiro de se livrar do financiamento privado da sua dívida, ou pelo menos manter a dívida num nível muito moderado.
Os governos que sistematicamente gastam mais do que arrecadam em impostos acabam por ser mais responsáveis perante os mercados do que perante os eleitores. Se se recusarem a fazê-lo, numa atitude obstinada e rebelde, acabam por pagar o preço da desorganização da economia, com aumento das taxas de juro e da inflação, o que termina na desestabilização política.
Os governos populistas, além de serem sempre obstinados e pouco versados em questões económicas, têm uma forte tendência para gastar excessivamente na despesa pública. Estes excessos transformam-se em défices orçamentais, que se traduzem num aumento da dívida pública. Acima de um certo limite, os mercados começam a punir estes excessos, exigindo taxas de juro mais elevadas para continuar a financiar a dívida. Neste ponto, os governos começam a protestar contra os mercados, culpando-os pelos seus problemas.
Se os governos recuarem e aderirem a alguma forma de restrição fiscal, poupando para evitar que a dívida fique fora de controlo, será estabelecido um certo equilíbrio. Mas, se o governo insistir em cortejar os seus eleitores e continuar a gastar, não há forma de escapar ao desastre. As taxas de juro disparam ou os investidores fogem das obrigações governamentais, forçando a sua monetização e a inflação a explodir. Não há caminho alternativo.
Como disse há pouco, os mercados cometem muitos erros, mas, certos ou errados, têm grande poder sobre a política económica do governo e nem mesmo os governos autoritários são capazes de impor completamente a sua vontade em questões financeiras. No presente caso do Brasil, a intuição dos mercados tem muito mérito, uma vez que o actual surto de crescimento tem em grande parte a sua origem no excesso de gastos públicos.
Este excesso alimentou o consumo das famílias e impulsionou a actividade económica, mas ocorreu à custa de um grande aumento da dívida pública a um ritmo que não é sustentável. Em dezembro de 2022, a relação dívida/PIB era de 71,8% e o Instituto Fiscal Independente do Senado estima que chegará a 80% até o final de 2024, caminhando para algo em torno de 85% até o final de 2026. Nas condições atuais, um aumento de mais mais de 12 pontos percentuais no mandato do presidente Lula.
É uma trajetória que, se não for revertida, nos levará a uma espécie de colapso. Se o governo continuar a ignorar a realidade económica e apenas ficar de olho nas próximas eleições e na manutenção do poder, não haverá como errar nas suas previsões: estaremos perdidos.
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