A Câmara enviou, na noite desta sexta-feira, ao ministro Flávio Dino, do Supremo Tribunal Federal (STF), respostas a perguntas feitas pelo desembargador sobre as indicações para emendas da comissão. A Câmara repetiu o argumento de que agiu dentro da lei, seguindo as orientações do governo. Contudo, não apresentou a ata com detalhes solicitados pela Corte.
Em documento de 16 páginas, assinado pelo advogado da Câmara Jules Michelet Pereira Queiroz e Silva, a Câmara afirma que a divulgação das alterações seguiu o procedimento correto, de acordo com os pareceres dos Ministérios da Fazenda, Planejamento e Orçamento e Gestão; da Casa Civil e da Advocacia-Geral da União (AGU).
A carta diz que os procedimentos foram realizados em “completa legalidade” e que “o Congresso Nacional, tanto o Senado quanto a Câmara, adotaram as orientações anteriores do Poder Executivo, justamente porque as alterações da comissão não são vinculativas”.
Em novo capítulo da disputa entre Legislativo e Judiciário, Dino determinou que a Câmara responda de forma objetiva, até as 20h desta sexta, aos questionamentos sobre a indicação de recursos. Caberá agora ao ministro decidir se mantém a suspensão das alterações.
Sobre a falta de atas das sessões da comissão para aprovação das emendas, a Câmara argumentou que a exigência do STF sobre as indicações das emendas da comissão só vale a partir de 2025. Portanto, a obrigação será aplicada apenas a partir dos orçamentos dos anos seguintes.
Entre as dúvidas, Dino queria saber se todas as 5.449 emendas listadas em carta enviada ao Executivo foram, de fato, aprovadas pelas comissões. A Câmara, por sua vez, esquivou-se da questão e reiterou o pedido de liberação de recursos da ordem de R$ 4,2 bilhões.
Estranhamento
Na petição enviada à Corte, a Câmara também afirmou que estranhava que apenas a Câmara estivesse sendo questionada, “quando a competência para o assunto é do Congresso Nacional”, sugerindo que eventual recurso também poderia ser apresentado pelo Senado .
A disputa gira em torno de um documento assinado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), e 17 líderes partidários, que pediram ao Planalto, no dia 12 de dezembro, a liberação das emendas. O pedido ocorreu em meio a votações custosas para o governo federal, como o pacote de corte de gastos e a regulamentação da reforma tributária, que só avançou após a divulgação.
Ao mesmo tempo, Lira suspendeu o funcionamento das comissões da Câmara, entre os dias 12 e 20 de dezembro, argumentando que era preciso focar os trabalhos nos projetos deliberados em plenário.
Segundo ação movida por PSol, Novo, Associação Contas Abertas, Transparência Brasil e Transparência Internacional—Brasil, a manobra permitiu que R$ 4,2 bilhões, divididos em 5,4 mil emendas, fossem indicados sem seguir o trâmite legal, que inclui o debate em comissões . Por estarem suspensas, as comissões não conseguiram avaliar o destino das emendas.
A ação aponta ainda que parte das alterações sofreu alterações em sua indicação, totalizando R$ 180 milhões, dos quais R$ 73 milhões foram para Alagoas, reduto de Lira. Embora o governo federal não tenha apontado irregularidades, ao aprovar o pagamento dos aditivos, Dino aceitou a posição do PSol e suspendeu os recursos até que o Legislativo dê explicações. Determinou também que seja divulgada a destinação de cada alteração e sua respectiva aprovação em comissões.
A Câmara respondeu aos questionamentos em ofício enviado na madrugada desta sexta-feira, assinado pelos advogados da Casa. O documento de 22 páginas nega que tenha havido qualquer incumprimento das decisões do Tribunal sobre a transparência das alterações ou irregularidades na suspensão da actividade das comissões.
“Fica agora rejeitada qualquer imputação de tentativa de descumprimento da decisão do tribunal. Nestes casos, a Câmara dos Deputados tem atuado de forma cooperativa e de boa-fé, em diálogo institucional sincero com os poderes Executivo e Judiciário para melhorar o processo de elaboração e execução orçamentária de forma transparente e eficiente”, afirmou o órgão.
A Câmara argumentou que as atas de divulgação das alterações questionadas estão publicadas no site da instituição desde novembro de 2023 e que os valores foram aprovados. Sobre a suspensão das comissões em dezembro, a Câmara afirmou que a suspensão é habitual quando há discussões importantes no plenário.
“O único objetivo da decisão foi dar preferência à avaliação de temas considerados prioritários para o país, como a reforma tributária e o pacote de corte de gastos. Portanto, não podemos falar em ato ilegal ou abusivo”, afirmou. “A suspensão das reuniões das comissões é habitual nesta Câmara, quando há necessidade de apreciação pelo plenário de assuntos urgentes e relevantes para o país”.
No final do documento, a Câmara pede a libertação do valor e defende que caso contrário poderá haver “prejuízos e riscos de descontinuidade de serviços públicos fundamentais, nomeadamente de saúde”.
Não estou convencido
Flávio Dino, porém, rejeitou a explicação e exigiu nova resposta “objetiva” até as 20h desta sexta. Segundo ele, a primeira carta não continha “as informações essenciais” solicitadas pela Corte. “O encerramento do exercício se aproxima sem que a Câmara dos Deputados forneça as informações essenciais, insistindo em interpretações incompatíveis com os princípios constitucionais de transparência e rastreabilidade, imperativos para a regular aplicação dos recursos públicos”, criticou Dino em sua decisão.
Ele também enviou um questionário com quatro perguntas diretas, para serem respondidas pela Câmara: se as emendas questionadas foram aprovadas ou não em comissões e quando; se houve novas indicações após a aprovação das alterações em comissões; se a Resolução Congresso nº 001/2006 autoriza transferências; e se existe algum outro ato normativo que legitime as alterações.
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