O juiz aposentado Souza Prudente, professor da Escola Federal de Justiça, enfatizou a gravidade dos atos extremistas de 8 de janeiro de 2023, considerando-os uma tentativa de “destruição do Estado Democrático de Direito” e uma ação “irracional” contra o resultado da votação caixas.
Souza Prudente destacou o papel fundamental das instituições, como a Polícia Federal e o Ministério Público Federal, que conduzem as investigações e ressaltou que a anistia aos condenados do dia 8 de janeiro era impossível e “inconstitucional”. Confira abaixo trechos da entrevista das jornalistas Ana Maria Campos e Jaqueline Fonseca no programa CB.Poder, parceria entre Correspondência e TV Brasília:
Como você avalia o que aconteceu em 8 de janeiro de 2023?
Inclusive foi registrada uma violência que nos deixou completamente perplexos com o que aconteceu ali. O movimento se propôs a destruir prédios públicos, como se quisesse alterar o resultado das urnas que elegeram o presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Algo irracional e estúpido contra o Estado Democrático de Direito.
Que lições podemos tirar deste episódio? Talvez ensinar aos mais jovens a história da ditadura e da tortura no Brasil?
Esses jovens hoje vivem uma realidade completamente diferente daquela que vivíamos em 1964. Suas mentes são guiadas pela influência das notícias falsas que circulam nas redes sociais. Mesmo assim, tudo isso depende da formação pessoal de cada pessoa. Acredito que só um jovem desorientado, sem o mínimo de solidez na sua formação, poderia criticar ou deixar de valorizar um sentimento democrático efetivo.
Você acredita que a investigação conseguirá identificar os responsáveis pelo movimento golpista?
Não tenho dúvidas. Acho que a Polícia Federal e o Ministério Público estão realizando um magnífico trabalho investigativo, analisando provas irrefutáveis para apresentar ao Supremo Tribunal Federal. Uma questão que surge frequentemente é sobre a competência do Supremo Tribunal para conduzir estas investigações. Agora, o que precisamos verificar é quem está no comando dessas investigações. Sem dúvida, ele é um dos maiores constitucionalistas que temos no Brasil, que é o ministro Alexandre de Moraes. O seu trabalho na determinação dessas responsabilidades também é magnífico. Esta competência deve permanecer com o Supremo Tribunal.
O 8 de Janeiro não nasceu da noite para o dia, foi pensado e formado nas redes sociais. A Meta anunciou que removerá mecanismos para conter a desinformação. Esse movimento poderia trazer riscos à democracia brasileira?
Acho que não há a menor chance, até porque acredito que o Ministério Público Federal tem agido com diligência, muita coragem e determinação nas ações necessárias para combater medidas dessa natureza. Sem dúvida essas medidas não são inspiradas nos princípios democráticos que praticamos aqui no Brasil. Acredito que isso deva chegar ao conhecimento formal do Supremo Tribunal Federal para que sejam tomadas as decisões necessárias para inibir medidas desta natureza. Até porque o Supremo, em processo relatado pelo ministro Alexandre de Moraes, já demonstrou, com a suspensão da empresa X, que não aceita redes ou empresas que não respeitem as leis brasileiras. Daí a importância de destacar esse magnífico trabalho do Ministro Alexandre de Moraes, desde o momento em que assumiu a função de juiz do Supremo Tribunal Federal e também quando presidiu o Tribunal Superior Eleitoral. Este tem sido um sinal de coragem do Ministro Alexandre de Moraes, uma coragem que resulta da sua cultura. Costumo dizer: o juiz que não estuda, que não aprimora seus conhecimentos científicos, não tem coragem de decidir. A ignorância é um antídoto para a coragem do magistrado. E a coragem deve ser uma das virtudes essenciais para o exercício do Judiciário em qualquer nível de jurisdição no Brasil.
Fala-se muito em anistia para os condenados de 8 de janeiro. Como você avalia isso?
A rigor, temos que fazer uma distinção com base no que estabelece a Constituição. No artigo 5º, inciso XXXVI, está escrito que a lei não prejudicará o ato jurídico perfeito, os direitos adquiridos e a coisa julgada. Jamais será possível considerar qualquer lei ou emenda à Constituição que contrarie esse dispositivo, justamente porque a instituição do ato jurídico perfeito e da coisa julgada é cláusula imutável. O ato jurídico perfeito refere-se a uma decisão que já transitou em julgado, como, por exemplo, a decisão do Tribunal Superior Eleitoral que determinou a inelegibilidade do ex-presidente Jair Bolsonaro até o ano de 2030. Portanto, não há mais o que considerar sobre qualquer lei de anistia a favor de Bolsonaro à luz desta decisão. Isso tem coisa julgada, imutável, e qualquer lei ou emenda à Constituição que vá nesse sentido será declarada pelo Supremo Tribunal Federal como flagrantemente inconstitucional. O Judiciário, por sua vez, só poderá rever uma decisão dessa natureza se for provocado, pois não atua de ofício. E essa provocação teria que ser feita pelo competente e dentro do prazo legal. Esses prazos, porém, já passaram, tornando a decisão imutável. Relativamente às situações de 8 de Janeiro, em que algumas pessoas ainda não foram julgadas, talvez, neste sentido, pudesse ser considerada uma lei de amnistia. Mas isso não seria justo, pois, devido ao atraso no julgamento de alguns, ficariam isentos, enquanto outros, já julgados, estariam cumprindo pena. Isto seria sem dúvida injusto para pessoas que cometeram os mesmos crimes. Portanto, é algo que deve ser avaliado pelo Supremo Tribunal Federal, considerando também o princípio constitucional da igualdade de tratamento das partes envolvidas neste contexto. No que diz respeito aos que já foram julgados, não será possível cogitar qualquer tipo de anistia. Ou seja, mesmo que o Congresso aprove algo nesse sentido, o Supremo certamente o considerará inconstitucional. E, como eu disse, o Judiciário só pode decidir se for provocado. Mas temos um Ministério Público muito diligente, que, sem dúvida, não deixará passar uma situação como esta.
Você é autor de uma decisão histórica que permitiu a abertura dos arquivos da Guerrilha do Araguaia. Como foi essa determinação?
Esta decisão foi histórica por vários motivos. Em primeiro lugar, esse processo foi o mais antigo da Justiça Federal do Brasil, com mais de 25 anos de tramitação. Envolveu familiares de desaparecidos políticos durante a Guerrilha do Araguaia, que buscaram, por meio dessa ação, obrigar a União a indicar os túmulos de seus entes queridos para que pudessem ser lavradas as devidas certidões de óbito. Este processo está agora a ser realizado depois de mais de duas décadas, com a exumação dos corpos e a entrega de um relatório oficial do Ministério da Guerra, datado de 5 de janeiro de 1975, sob pena de multa diária. Gostaria de deixar claro que, em ações como esta, que visam a proteção dos direitos humanos, o que se busca não é apenas uma indenização, mas a garantia de um direito humano fundamental: o resgate e identificação de corpos e a obtenção de informações oficiais sobre os desaparecidos. Este direito à informação deve ser assegurado, com dados disponibilizados pelos Ministérios do Exército, da Marinha e da Aeronáutica. Foi com base neste princípio que tomamos, por maioria, a decisão que teve repercussão mundial. Esta acção não visa a punição, mas sim o reconhecimento de direitos, e, pela sua natureza, é um processo estruturalmente relevante. Recentemente, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), sob a presidência do respeitado ministro constitucionalista Roberto Barroso, determinou que fossem emitidos novos registros de óbito para todos os desaparecidos políticos, corrigindo a causa da morte, que, até então, havia sido registrada em um falso. A verdadeira causa, que é o desaparecimento forçado durante o regime militar de 1964, deve ser devidamente registada para que a verdade histórica seja reconhecida e respeitada.
Diante dessa decisão do CNJ de alterar a causa de morte dos perseguidos e mortos durante a ditadura, qual a importância da honra e da memória das vítimas?
Além de emitir certidão de óbito correta, a Comissão da Verdade, durante o governo Dilma, verificou 434 mortes políticas, que, até então, não haviam sido devidamente identificadas. A determinação do CNJ, portanto, atende parcialmente a essa demanda, ao garantir a emissão de certidões de óbito que registrem efetivamente a causa da morte. Contudo, a abertura dos arquivos permitiu às pessoas compreenderem a história de seus familiares, o que vai além da simples identificação dos corpos, pois envolve um reconhecimento histórico mais amplo. O objetivo desta ação é justamente identificar os corpos ou ossos de seus familiares. Em 1988, um grupo de advogados do Brasil formou uma comissão para investigar provas que levassem à localização desses corpos e obteve informações relevantes. Um curioso registo revela que um agricultor encontrou, perto de uma vala onde estavam enterrados guerrilheiros decapitados, uma lata de leite Nestlé que continha os bilhetes de identidade de alguns deles. Outros órgãos, porém, não pertenciam apenas a guerrilheiros, mas também a pessoas comuns, sem envolvimento no movimento, além de comunidades indígenas que não só foram mortas, mas destruídas por esse movimento durante a ditadura militar.
A ditadura militar tem sido muito debatida nas redes sociais depois do filme Ainda estou aqui. Você já viu o filme? O que você achou?
Ainda não assisti, mas quero muito ler o primeiro livro. Acho que é uma obra ímpar registrar a memória de Rubens Paiva, principalmente porque foi escrita por seu filho. Com certeza assistirei ao filme também. É uma coincidência incrível como eventos históricos importantes estão conectados, como essa decisão do CNJ sobre as certidões de óbito, que acredito ter sido intencional. Acredito que o presidente do CNJ, por provocação do atual ministro dos Direitos Humanos e Cidadania, optou por anunciá-lo no dia 10 de dezembro de 2024, data em que se celebra a Convenção dos Direitos Humanos em todo o planeta. Além disso, a premiação à atriz Fernanda Torres parece ser mais uma coincidência significativa, ocorrendo justamente no dia em que celebramos os valores democráticos e repudiamos a abominável agressão ao Estado Democrático de Direito no Brasil. Acho tudo isso muito interessante.
imagem de empréstimo
como conseguir crédito no picpay
picpay instalar
cred rápido
banco noverde
noverde whatsapp
siape consignação
bk bank telefone
apk picpay
consignado inss bancos
px significado