Depois que Mark Zuckerberg, dono da Meta — que controla o Instagram e o Facebook, além do aplicativo WhatsApp e de mensagens —, insinuou que o Supremo Tribunal Federal censura publicações nas redes sociais, ontem foi a vez do STF deixar claro que as plataformas que eles usam só funcionarão no país se “respeitarem a legislação brasileira”. O recado foi dado pelo ministro Alexandre de Moraes, responsável pelo inquérito das fake news, que tramita na Justiça.
“Nossa Justiça Eleitoral e nosso STF já demonstraram que esta é uma terra que tem lei. As redes sociais não são uma terra sem lei. No Brasil, (as redes sociais) só continuarão a funcionar se respeitarem a legislação brasileira, independentemente das bravatas de líderes irresponsáveis das big techs”, alertou Moraes.
O ministro criticou ainda os diretores das plataformas, afirmando que “porque têm dinheiro, acham que podem governar o mundo”. “Para o resto do mundo não podemos falar, mas para o Brasil, tenho absoluta certeza e convicção de que o STF não permitirá que as big techs, as redes sociais, continuem a ser instrumentalizadas, de forma intencional ou negligente. ampliar o discurso de ódio, o nazismo, o fascismo, a misoginia, a homofobia e os discursos antidemocráticos”, destacou.
O alerta de Moraes veio em conversa, promovida pelo STF, para relembrar os dois anos dos ataques golpistas de 2023 —que culminaram na depredação dos prédios dos Três Poderes. Na avaliação do ministro, este e outros gestos golpistas foram motivados pela falta de regulação da rede.
Regulamento
No mesmo evento, o ministro Gilmar Mendes defendeu a regulamentação das redes e afirmou que a criação de normas “não pode ser confundida com censura”. “Essa trajetória normativa nunca pode ser confundida com a censura. Muito pelo contrário: representa não apenas uma evolução jurídica, mas constitui a pedra angular sobre a qual se constrói uma esfera digital democrática e pluralista, capaz de harmonizar a liberdade de expressão com a responsabilidade social no ambiente virtual. meio ambiente”, observou.
Zuckerberg anunciou na terça-feira que a ferramenta de verificação de grupos Meta será substituída por “notas da comunidade”, gratuitas para todos os usuários. Disse ainda que existem tribunais secretos em países latino-americanos para censurar conteúdos —uma insinuação sobre a atuação do STF, que, em 2024, apoiou e venceu uma queda de braço com o bilionário Elon Musk, cuja plataforma X (antigo Twitter) não conseguiu cumprir uma série de ordens judiciais. A rede só retomou as operações após cumprir as regras impostas por Moraes e pagar multa milionária.
O Supremo Tribunal Federal recebeu, ontem, quatro obras de arte produzidas com material proveniente da destruição das instalações do Tribunal. Foram produzidos por Valério Pena-Costa, Carppio de Morais, Marilu Cerqueira e Mário Jardim, todos do Distrito Federal. As peças foram entregues ao ministro Edson Fachin, presidente interino do tribunal.
Messias: “Não cruzaremos os braços”
Em reação à decisão do Meta, o procurador-geral da União, ministro Jorge Messias, disse ontem que o Brasil possui mecanismos legais para lidar com a desinformação. Segundo a AGU, o governo não permitirá que a internet se torne um espaço não regulamentado.
“Esta não é uma terra sem lei, obviamente. Nosso sistema legal oferece anticorpos para combater a desordem informacional. Portanto, não ficaremos de braços cruzados”, disse ele. Para ele, o novo posicionamento do Meta “enfatiza a necessidade de conclusão no julgamento sobre a responsabilidade das redes sociais pelo Supremo Tribunal Federal” — que é de 3 x 0 para punir a plataforma que não se responsabiliza pelo conteúdo que veicula.
O futuro ministro da Secretaria de Comunicação Social (Secom), Sidônio Palmeira, também comentou a mudança de postura do Meta. Afirmou que retirar o serviço de verificação de conteúdos é “ruim para a democracia”, pois reduz o controlo da desinformação.
Sidônio também defendeu a regulamentação das redes sociais no Brasil. Ele destacou que o governo e a Justiça brasileiros podem adotar outra postura para garantir a integridade das informações, caso esta seja violada pelo Instagram, Facebook, Threads ou WhatsApp —plataformas que fazem parte do Meta. Isso significaria que o Brasil, como “país autônomo e independente”, pode ter regras próprias sobre o assunto.
“Isso é ruim para a democracia, porque não se controla a proliferação do ódio, da desinformação, das fake news. Esse é o problema, precisamos ter controle. Precisamos ter regulação das redes”, comentou Sidônio, em evento em memória dos dois anos desde os atos golpistas de 8 de janeiro de 2023, no Palácio do Planalto.
Trinta dias para explicar
Ontem, o Ministério Público Federal determinou que a Meta prestasse explicações, no prazo de 30 dias, sobre os impactos das novas regras de conferência de informações. O grupo afirmou que, a princípio, as mudanças ocorreriam apenas nos Estados Unidos. Porém, o MPF quer que as big tech respondam aos questionamentos sobre a possível aplicação dessas mudanças no Brasil e suas consequências.
Caso a plataforma confirme que a desaceleração do serviço de checagem será aplicada aqui, o MPF também buscará duas respostas: 1) quando essas políticas serão implementadas; e 2) maiores esclarecimentos sobre as mudanças, a fim de avaliar quais ações podem “impactar os direitos dos usuários brasileiros”.
Assinada pelo advogado Yuri Corrêa da Luz, a carta ao Meta destaca que “já existe um marco regulatório atualmente em vigor no Brasil, que impõe aos responsáveis pelos provedores de aplicativos que operam em nosso país deveres de adotar medidas para que seus produtos e serviços não afectam estruturalmente os direitos fundamentais dos nossos cidadãos”.
No mesmo documento, ele quer que a Meta informe as mudanças que eventualmente poderão ser feitas no país, especificando quando ocorrerá o rompimento com os órgãos fiscalizadores. Também pergunta quantas agências deixarão de trabalhar na moderação de conteúdo. E quer saber mais dois factores: que as violações cometidas nas plataformas serão consideradas “graves” e que serão excluídas “as restrições sobre temas como a imigração e o género que são objecto de frequentes discursos e debates políticos”.
Procurado por CorrespondênciaMeta se recusou a comentar.
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