Porto Alegre — Ao mesmo tempo em que as águas do Lago Guaíba recuam e os esforços de reconstrução avançam no Rio Grande do Sul após o pior desastre climático da história do país, o governador Eduardo Leite busca reduzir os danos de ser apontado como um dos principais responsáveis pela inundações . Mas mancham o currículo de alguém que já foi visto como um dos expoentes do PSDB — principalmente quando disputou a indicação à Presidência da República e perdeu para João Doria na polêmica prévia do partido, em novembro de 2021 — mudanças no regras da lei ambiental estadual, que flexibilizaram os parâmetros de uso do solo, inclusive em Áreas de Preservação Permanente (APPs) para construção de barragens.
Mas, além das cerca de 500 alterações no Código Ambiental do Rio Grande do Sul, Leite enfrenta críticas pelas reduções, no último orçamento, na destinação de recursos estaduais da Defesa Civil para prevenção de desastres —o que aumenta ainda mais a pressão sobre sua gestão. Com a devastação do estado pelas enchentes, para as quais as autoridades só acordaram no dia 29 de abril, o tucano não conseguiu frear o crescimento da presença do governo federal no Rio Grande do Sul — e se inicialmente disse que o momento não era ” de procurar os responsáveis” pela tragédia, com o passar dos dias ele deixou de esconder seu desconforto com a presença de representantes do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Na tentativa de recuperar protagonismo na resposta à crise no estado, em duas entrevistas Leite argumentou que tinha “outras agendas prioritárias” — como a responsabilidade fiscal — para justificar a inação do governo gaúcho em relação aos especialistas ‘ alertas sobre a possibilidade de inundações. A repercussão foi negativa e levou o governador a evitar setores da imprensa.
Incompatibilidade
Até ontem, a resposta federal à tragédia totalizou aproximadamente R$ 62,5 bilhões —o que deixou o tucano ainda mais à mercê da crise. Um exemplo: enquanto o governo federal começou a pagar, ontem, via Pix, o Auxílio à Reconstrução no valor de R$ 5,1 mil a todos os atingidos, o governo do Rio Grande do Sul ainda distribui cartões para transferência do auxílio de R$ 2,5 mil. Mas esse dinheiro só chega aos atingidos pelas enchentes registradas no CadÚnico.
Esse protagonismo do governo federal nas ações de auxílio ao estado é mal recebido no Palácio Piratini, sede do governo do Rio Grande do Sul. Assim que Paulo Pimenta foi indicado por Lula para assumir a Secretaria Extraordinária de Apoio à Reconstrução do Rio Grande do Sul, ele passou a ser chamado de “interventor”. A irritação aumentou assim que o governo do estado deixou de centralizar iniciativas e canalizar recursos transferidos pela União.
Sob o argumento de acelerar a liberação de dinheiro para recuperação —e evitar o aumento das perdas, cujos cálculos ainda são considerados subestimados pelos especialistas—, o governo federal tem procurado atuar diretamente nos municípios. Assim, deixou nas mãos dos prefeitos a responsabilidade de cadastrar os beneficiários dos programas de auxílio federais.
Porém, em algumas cidades administradas por opositores ao Palácio do Planalto, houve demora na listagem dos atingidos pelas enchentes. Pimenta e o ministro da Integração e Desenvolvimento Regional, Waldez Goes, entraram em campo e foi iniciada a elaboração da lista de nomes. Mais uma vez Leite estava a reboque.
Cobrar
A irritação com a atuação do governo federal diretamente nos municípios ficou clara na última quarta-feira, quando ministros divulgaram mais um pacote de ações para a reconstrução do estado. Leite e o vice-governador Gabriel Souza não participaram do anúncio, mesmo tendo sido convidados.
Na última segunda-feira, em audiência na Câmara de Indústria, Comércio e Serviços de Caxias do Sul, o governador insistiu no problema fiscal. “A suspensão da dívida não terá o efeito desejado para a reconstrução se, por outro lado, tivermos um desequilíbrio profundo pela perda de arrecadação. O Rio Grande do Sul gera uma arrecadação de impostos federais, por ano, muito maior do que gera. recebe em troca. Neste caso, neste momento difícil, precisamos de mais receitas para garantir o equilíbrio, manter os serviços e promover a recuperação do Estado”, notou.
O vice-governador reforçou a mesma exigência ao Correio. “Vamos perder mais de metade da receita do Estado. Estamos a viver a destruição de empresas e de património. A suspensão (do pagamento) da dívida (do Estado com a União), por 36 meses, serviria para a reconstrução Mas, se não compensarmos a perda de receita, provavelmente precisaremos usar esse recurso para pagar a máquina, até para evitar atrasos salariais”, destacou Gabriel Souza.
O governo Lula, porém, quer evitar criar atritos com o governador do Rio Grande do Sul. Como o auxílio ao Rio Grande do Sul foi definido como prioridade pelo presidente, o conflito com Leite é considerado um desgaste desnecessário. Para o CorrespondênciaPaulo Pimenta e Waldez Goes afirmaram que a colaboração com o Estado está acima das diferenças políticas.
“Você pode ter alguma opinião, de um assessor ou de outro, mas a relação com o governador é muito boa. Estamos seguindo a definição do presidente Lula de ajudar o estado em tudo que for necessário”, afirmou.
“Vim ajudar o Rio Grande do Sul e o governo do estado”, disse Pimenta.
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