A Advocacia-Geral da União (AGU) anunciou audiência pública para a próxima semana com o objetivo de discutir os impactos da decisão da Meta (que engloba Facebook, Instagram e WhatsApp) de encerrar o serviço de checagem de fatos. A instituição afirmou que alguns aspectos das informações fornecidas pelas big tech causam “séria preocupação” e abrem precedentes para o descumprimento da legislação brasileira.
Na noite desta segunda-feira, Meta explicou ao governo brasileiro sobre os efeitos para o país do fim do programa de checagem de informações nas redes sociais nos Estados Unidos. A empresa afirmou que está comprometida com a transparência e a liberdade de expressão e com o respeito aos direitos humanos.
Em nota, a Procuradoria-Geral da República destaca a recente atualização da Política de Conduta de Ódio, feita pela empresa. “Alguns aspectos contidos no documento Meta causam séria preocupação na AGU e nos órgãos do governo federal. Principalmente a confirmação da alteração e adoção, no Brasil, da Política de Conduta de Ódio que, com todas as evidências, pode representar terreno fértil para violação do legislação e preceitos constitucionais que protegem os direitos fundamentais dos cidadãos brasileiros”, afirma.
A AGU destaca que a decisão da Meta contraria afirmações feitas pela empresa em manifestações recentes durante a discussão sobre o Marco Civil da Internet, no âmbito de processos que tramitam no Supremo Tribunal Federal (STF).
“Nessas manifestações, os representantes das empresas garantiram que as então políticas de governança de conteúdo eram suficientes para proteger os direitos fundamentais dos usuários”, ressalta.
No documento enviado à AGU, Meta explicou que o programa de fact-checking será substituído por notas comunitárias e reforça que a mudança começará nos Estados Unidos. A empresa afirmou que prioriza a segurança e privacidade do usuário, visando eliminar abusos, e que tem o compromisso de ser transparente com a comunidade em relação às mudanças na política de conteúdo.
Mesmo com a explicação da Meta, o governo afirma que as medidas “não são suficientes para proteger os direitos fundamentais da cidadania”. “No entendimento da AGU e dos ministérios que atuam no tema, os atuais termos de uso das plataformas, bem como as alterações agora informadas pela Meta, não estão adaptados à legislação brasileira.”
Medições
A audiência pública terá como objetivo discutir os efeitos da nova política do Meta, o dever de zelo das plataformas digitais, os riscos da substituição do Programa de Fact Checking no exterior e as medidas a serem adotadas “com o objetivo de garantir o cumprimento da legislação nacional e a proteção dos direitos”.
Serão convidados a participar órgãos governamentais e entidades da sociedade civil que tratam do tema redes sociais. Também estarão presentes especialistas, acadêmicos e representantes de agências de verificação de fatos.
Na semana passada, o CEO da Meta, Mark Zuckerberg, afirmou que a ferramenta de verificação será substituída pelas notas da comunidade, gratuitas para todos os usuários. A empresa afirmou que adotará regras mais brandas sobre a disseminação de informações falsas e alegou que as novas regras impedirão o que classificou como “censura”.
O advogado Luis Fernando Prado — especialista em privacidade e proteção de dados — acredita que é prematuro criticar a decisão das big tech. ‘”É um pouco precipitado condenar essa mudança sem saber e sem ter base empírica para afirmar que ela realmente tornou o ambiente mais inóspito. Os mecanismos de moderação de conteúdo adotados pela plataforma, seja antes da mudança ou depois da mudança, são igualmente válido”, frisou. “Precisamos inclusive ver como os usuários vão se comportar ao denunciar o conteúdo para que, a partir daí, possamos ter uma reflexão melhor e uma visão mais clara sobre essa mudança.”
Para o criador do Instituto Brasileiro de Regulação da Inteligência Artificial (IA), Marcelo Senise, o Meta demonstrou responsabilidade e respeito ao ordenamento jurídico brasileiro. “A AGU também atuou com firmeza e rapidez, garantindo que a plataforma cumprisse os requisitos legais. Essa dinâmica destaca a importância do diálogo e da atuação eficiente entre entidades privadas e órgãos governamentais para cumprir as normas e proteger os direitos no ambiente digital”, afirmou.
Na opinião do advogado Ulisses Alves da Conceição — especialista em proteção digital e proteção de dados —, apenas contar com a ferramenta de notas comunitárias pode facilitar a disseminação de conteúdos falsos e outros crimes na internet.
“É um modelo saudável. A própria comunidade aponta possíveis violações. Porém, não podemos e não devemos abrir mão da fiscalização da Meta em si. Deixando-a nas mãos da comunidade, ficamos à deriva no contexto da proteção. Alguns dirão que é por causa da liberdade de expressão, mas se olharmos para o contexto das redes sociais, especialmente aquelas administradas pela Meta, temos na verdade um cenário de liberdade para o crime, já que anúncios pagos fraudulentos são frequentemente divulgados tanto no Facebook quanto no Instagram e, mesmo após as reclamações continuarem em vigor”, ele argumentou.
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