Faltando duas semanas para a abertura do ano Judiciário, o Supremo Tribunal Federal (STF) continua funcionando em regime de plantão em seus gabinetes, como vem fazendo desde dezembro, com decisões importantes sobre temas como o andamento da investigação do suposto tentativa de golpe de Estado e, principalmente, ações relacionadas a emendas parlamentares. O gabinete do ministro Flávio Dino, que é relator do processo que trata da liberação de recursos e do orçamento secreto, tomou decisões no mês passado que geraram reação no Congresso e no Executivo.
O Supremo funcionou de 21 a 31 de dezembro, sob o comando do presidente, ministro Luís Roberto Barroso. Ele atendeu casos urgentes em que o Tribunal foi acionado. De 1º a 19 de janeiro, a função foi exercida pelo vice-presidente, Edson Fachin. Barroso assume hoje novamente e segue até 31 de janeiro. O STF marcou a abertura do ano judicial no dia 3 de fevereiro.
A mudança, porém, não se aplica aos casos denunciados pelos magistrados que decidiram manter o trabalho durante o recesso: Alexandre de Moraes, André Mendonça, Gilmar Mendes e Dias Toffoli. Os quatro trabalham em processos em seus escritórios e em outros que lhes são distribuídos por sorteio ou prevenção no período.
Os ministros Cristiano Zanin e Flávio Dino continuaram trabalhando, mas apenas para adotar medidas ou petições relacionadas a ações específicas. No caso de Dino, ele focou em ações referentes ao cumprimento da transparência e rastreabilidade das emendas parlamentares.
Na semana passada, Dino estabeleceu o prazo de 30 dias para que o governo federal e os estados publicassem regras e diretrizes sobre responsabilização na utilização de recursos por instituições de ensino superior e suas respectivas fundações de apoio.
A decisão foi dada em resposta a petições apresentadas por fundações de apoio após o magistrado suspender o repasse de recursos a 13 organizações não governamentais (ONGs) e entidades do terceiro setor que não adotam mecanismos de transparência adequados ou não divulgam informações sobre a aplicação de recursos decorrentes de emendas parlamentares.
Às vésperas do Natal, Dino também determinou a suspensão do pagamento de R$ 4,2 bilhões do valor. O magistrado determinou que a Polícia Federal abrisse inquérito para apurar o caso e determinou que o governo só poderia executar o orçamento do ano de 2025 com a conclusão de todas as medidas corretivas ordenadas, como a indicação do autor e do beneficiário final do recursos no Portal da Transparência e a separação entre o relator do Orçamento e o autor das alterações.
No dia 30 de dezembro, o Senado apresentou explicações à Corte sobre as alterações da comissão ao Orçamento, devido à suspensão de R$ 4,2 bilhões. A Câmara argumentou que as determinações contidas nas decisões do STF foram “estritamente observadas”, estabelecendo condições para a retomada da execução orçamentária das emendas parlamentares.
Antes do fim do recesso, o ministro também deve focar em outra ação. Na semana passada, a Polícia Federal enviou ao STF o inquérito sobre a Operação Overclean, que investiga suspeitas de desvio de recursos públicos, inclusive de emendas parlamentares. A corporação encontrou evidências da participação de pessoas com privilégios legais no esquema.
As emendas são indicativos dos gastos que deputados e senadores fazem no orçamento do governo para obras e projetos nos estados que os elegeram. O pagamento estava suspenso desde agosto, por decisão do STF. A decisão obrigou os poderes Executivo e Legislativo a trabalharem juntos para aprovar uma lei que proporcionasse mais transparência e rastreabilidade aos recursos.
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Pouco antes do recesso, o ministro havia autorizado, com ressalvas, a retomada do pagamento. A situação não gerou crise institucional, mas entrou em choque com o Judiciário, pois na avaliação dos especialistas, o texto aprovado apresenta lacunas quanto às divisões políticas dos recursos e, ao tirar o controle de parte considerável da execução do Orçamento, poderia invadir a competência do governo – responsável pela formulação de políticas públicas em matéria de transferências.
O cientista político Elias Tavares destaca que, mesmo em período de descanso institucional, os ministros continuam a tratar de questões que exigem resposta imediata, como emendas parlamentares e outras decisões de impacto nacional. “A atividade dos gabinetes durante o recesso é uma demonstração de como o Poder Judiciário se adapta à dinâmica do país, garantindo que as questões urgentes não ficam ociosas e que a Justiça continua a ser um pilar ativo da democracia”, afirma.
Conspiração de golpe
Para 2025, a Justiça se prepara para o inquérito da Polícia Federal que indiciou o ex-presidente Jair Bolsonaro e outros 36 acusados de tentativa de golpe de Estado e abolição violenta do Estado Democrático de Direito. A denúncia está nas mãos da Procuradoria-Geral da República (PGR). O caso ainda não foi decidido devido ao recesso de fim de ano no STF, iniciado no dia 19 de dezembro.
Na investigação do golpe, agentes da PF recuperaram arquivos apagados no computador do tenente-coronel Mauro Cid, ex-ajudante de campo de Bolsonaro, com detalhes sobre o plano “Punhal Verde e Amarelo”.
Caberá ao titular do Ministério Público Federal (MPF), Paulo Gonet, decidir se Bolsonaro e os demais indiciados serão denunciados ao Supremo sobre as acusações. As defesas dos investigados também deverão constar dos autos.
Além de concluir esta investigação, o Supremo Tribunal Federal deverá retomar, este ano, o julgamento que discute a responsabilidade das redes sociais pelos conteúdos publicados pelos seus utilizadores. No total, são três ações que discutem o Marco Civil da Internet, lei que regulamenta as atividades das plataformas no Brasil.
O debate gira em torno da constitucionalidade do artigo 19 do Marco Civil, que exige ordem judicial prévia para excluir conteúdos e responsabilizar empresas por danos causados pelas publicações. Os processos em discussão estão sendo relatados pelos ministros Dias Toffoli e Luiz Fux. O debate reacendeu depois que o grupo Meta (que engloba Facebook, Instagram e WhatsApp) encerrou seu serviço de checagem de fatos. Diante do caso, Alexandre de Moraes reiterou sua posição sobre a manutenção da integridade das informações no Brasil. O juiz disse que as plataformas só continuarão a funcionar no país se “respeitarem a legislação brasileira”.
O analista político Melillo Dinis destaca também ações ligadas à questão climática. “As questões da chamada agenda verde continuarão, após o julgamento, em 2014, das ações climáticas (PPCDAm, Fogo, Fundo Amazônia, Fundo Clima, Licenciamento Ambiental, etc.), ao lado da tentativa de conciliação do ministro Gilmar Mendes sobre questões indígenas”, afirma o especialista.
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