Após 44 anos do primeiro grupo feminino nas Forças Armadas, a Marinha do Brasil, pioneira na incorporação de mulheres ao serviço, fechou o ciclo na última sexta-feira, garantindo-lhes o acesso a todas as áreas de atuação da Força. Desde 7 de julho de 1980 até os dias atuais, com a formatura da primeira turma de 114 mulheres militares da Marinha, a Marinha registrou avanços na participação feminina, até mesmo em seus grupos de elite.
Para a primeira mulher negra do círculo de oficiais generais das Forças Armadas, contra-almirante Maria Cecília Barbosa da Silva Conceição, é preciso comemorar. Para ela, o fato de agora as mulheres poderem escolher qualquer cargo ou posição dentro da instituição, além de ampliar as possibilidades de carreira para as mulheres, traz aspectos positivos para a própria Força. “Essa foi a última peça do painel de oportunidades que foi aberto. Começamos do zero, em 1980, e hoje temos cerca de 11% de mulheres participando do total de militares da ativa. contínua”, aponta o médico da Marinha.
A incorporação de militares femininas entre os fuzileiros navais, considerado um grupo de elite nas operações da Marinha, elimina o último espaço que era restrito aos homens, reforça o capitão Vanderli Júnior, comandante do Centro de Instrução Almirante Milcíades Portela Alves (Ciampa), responsável pelo treinamento do Corpo de Fuzileiros Navais. primeira turma de fuzileiros femininas formada esta semana. Durante os quatro meses de formação, o comandante destaca ainda que a taxa de evasão entre as candidatas é aproximadamente metade da registada entre os candidatos do sexo masculino.
“No total foram 660 formandos, 114 mulheres e 546 homens. O curso é muito duro, mas uma das premissas é que deveria ser exatamente igual, não poderíamos amenizar nada porque eram mulheres. os mesmos parâmetros masculinos e tiveram um desempenho muito bom, tanto que a taxa de evasão das mulheres foi quase a metade da dos homens, mostrando o quão guerreiras elas eram”, destaca.
Para a contra-almirante Maria Cecilia, o número impressiona. “Mulher é isso, ela tem algumas características próprias, como não desistir, perseverar, superar dificuldades, muitas vezes conseguir conciliar problemas e dificuldades da própria vida pessoal dentro da vida profissional. participação por características próprias, como a perseverança”, explica.
A fuzileiro naval Letícia Alves, 19 anos, de Navegantes (SC), abandonou o curso superior de Educação Física para perseguir o sonho de ingressar nas Forças Armadas, por influência do pai, que é militar, e comemorou o feito inédito: “ Nós mostramos que podemos lidar com o máximo que eles puderem.”
Mesmo tendo ficado em segundo lugar entre os 660 formandos, homens e mulheres, ela admite que a dureza da formação a fez tremer. “Comecei a pensar se realmente estava no lugar certo, no lugar certo para mim, mas nunca pensei em desistir”, garante.
Carioca de Realengo, Jamily de Souza Franklin, 21 anos, outra nova militar da Marinha, escolheu a carreira militar por influência da mãe, que é sargento da Polícia Militar do Rio de Janeiro, e pela participação em uma Força Aérea projeto social em que praticou atletismo. “Acho que a carreira militar é a melhor forma de garantir a estabilidade financeira, mas só agora é que a ficha caiu, depois da formatura”, revela.
Dia da Marinha
Apesar da comemoração pela ampliação da participação feminina, Maria Cecília lembra que, este ano, a Força não pôde comemorar o Dia da Marinha do Brasil, 11 de junho, devido à tragédia climática ocorrida no Rio Grande do Sul. “Por respeito e por necessidade de mobilização de pessoal para socorrer as vítimas, a Marinha achou melhor restringir as comemorações, inclusive o Dia da Marinha”, lamenta o contra-almirante.
Apesar da discrição no registro da data, a Marinha do Brasil foi pega de surpresa pelo impacto no alcance das publicações da Força, registrando a data, que bateu todos os recordes junto com a divulgação das ações de resgate no estado do Rio Grande do Sul. Esta foi a segunda vez que a Marinha deixou de realizar atividades de comemoração da data, a primeira ocorrendo durante a pandemia da Covid-19.
“Finalmente chegamos lá”, diz pioneiro
A médica pioneira da Marinha, Dalva Maria, e sua filha, Luciana Mendes, capitã da corveta
Integrante do primeiro grupo feminino da Marinha, criado em 7 de julho de 1980, a anestesista Dalva Maria Carvalho Mendes, além de pioneira no primeiro grupo de militares do país, alcançou, ao longo de sua carreira, o posto de almirante e tornou-se também a primeira mulher no grupo de oficiais generais nas três Forças.
Aposentada da prática médica e nas reservas da Marinha, Dalva continua a acreditar que a sociedade deve caminhar para um modelo mais igualitário, onde homens e mulheres serão sempre julgados pelos seus valores e méritos, caminho que, acredita, tem sido trilhado pela Marinha.
Ele não esconde o orgulho nem o carinho por pertencer à Marinha, carinho que transmitiu à filha, a advogada e capitã de corveta Luciana Mendes, que hoje integra a Força-Tarefa Internacional 151, responsável pelo combate à pirataria no Mar Vermelho. Acompanhe abaixo os principais trechos da conversa:
Como era há 44 anos, quando você ingressou na vida militar como um dos pioneiros?
Em 1980 foi criado o Corpo Auxiliar Feminino da Marinha, e entramos em 1981, com a primeira turma desse corpo feminino. Havia, na época, 203 policiais. Não me lembro quantos quadrados, mas eram muitas mulheres. Na época as pessoas acharam muito interessante, era uma grande notícia, estávamos nas capas das revistas. Eles acharam fenomenal, digamos. O grupo virou celebridade, naquela época não existia WhatsApp, nada disso, mas as pessoas já gostavam de novidades.
Você foi o único que alcançou o posto de almirante?
Eu fui o primeiro, mas vieram outros dois, nenhum da minha turma. O meu grupo acabou por perder um pouco o ritmo, pois fomos posteriormente inseridos no corpo, quando o Estado-Maior Feminino dos Oficiais da Reserva da Marinha foi extinto e as mulheres foram integradas no Estado-Maior. Depois competimos com os homens e ficamos um pouco atrás em relação a eles.
Foi chamado de conselho de reserva?
Inicialmente, a Marinha não tinha certeza de que conseguiríamos nos adaptar ao cotidiano militar, éramos, até certo ponto, um corpo de prova. Depois, conseguimos demonstrar que éramos capazes de ser soldados.
Eles passaram com louvor?
Acredito que sim, pelo menos quero acreditar nisso, já que somos hoje 11% da força. Se você olhar para outras marinhas, de outros países, você verá que a participação é semelhante.
Este mundo não é muito masculino?
Sempre acreditei que era um profissional, e para mim profissional não tem sexo nem orientação sexual. Se ele estiver bem, ele andará. Se ele não for bom, ele sucumbirá. Sempre pensei assim e a Marinha parece concordar comigo. Acho que homens e mulheres têm que caminhar juntos, ombro a ombro, caso contrário a sociedade não funcionará bem.
Você foi um pioneiro nas forças armadas?
Em tempos de paz, sim, mas tínhamos muitas mulheres em tempos de guerra, grupos especiais, como um quadro regular. Em tempos de paz, a Marinha realmente vinha em primeiro lugar.
E o que representa hoje a primeira turma de mulheres fuzileiros navais?
Isso me deixou muito feliz, foi isso que eu sempre quis, que as mulheres pudessem competir por mérito, em todas as áreas da Marinha, e acho que finalmente chegamos lá.
Foram 44 anos. Não demorou muito?
Acho que não, é lógico que sempre queremos que as coisas andem muito rápido, mas às vezes, para acontecer de maneira adequada, as coisas precisam ser feitas com moderação. E temos que pensar no amadurecimento da mentalidade da sociedade em geral. Esta é uma mudança de mentalidade que foi conseguida, ficou demonstrado às autoridades que as mulheres também tinham maturidade para enfrentar os desafios.
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