*KARIN SANTIN
Em meio aos incêndios que atingem o país, pelo menos 5 mil focos em 24 horas, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), estudo da Universidade de Stanford, nos Estados Unidos, ganham força. Os cientistas procuram formas de proteger edifícios e casas, o que levou ao desenvolvimento de um hidrogel. O produto melhora a qualidade da água quando pulverizado em infraestruturas vulneráveis, criando uma camada protetora contra a transformação do gel quando submetido a altas temperaturas.
O estudo foi publicado na revista científica Materiais Avançados. Segundo o artigo, os novos géis duram mais e são significativamente mais eficazes do que os géis comerciais existentes. Os testes realizados indicaram que o efeito antifogo está presente até 455 dias após a aplicação. Atualmente, o tempo médio de secagem dos géis disponíveis no mercado é de 45 minutos.
“O hidrogel é feito com grande quantidade de água, mas evapora rapidamente ao entrar em contato com o calor do fogo. Sem água, o material se reorganiza e forma uma estrutura leve e porosa chamada aerogel, que é muito bom para isolar o calor. . Esse aerogel continua protegendo a superfície abaixo dele”, observa Brenno Silveira Neto, pesquisador do Instituto de Química da Universidade de Brasília (UnB), sobre a nova tecnologia.
Eric Appel, coautor do estudo, destaca que a reação química do hidrogel “permanece intacta enquanto a água ferve por causa do calor”. Especialistas afirmam que, no processo de criação de aerogéis em laboratório, são utilizados métodos de secagem não convencionais que permitem a transformação direta do estado sólido para o gasoso, sem passar pelo líquido. No caso do hidrogel desenvolvido pela equipe de Appel, é a sílica que permite a evaporação quase instantânea da água.
Segundo Appel, a celulose e a sílica são materiais de alta disponibilidade utilizados nas indústrias papeleira, farmacêutica e alimentícia, entre outras. Quando combinados, os dois componentes apresentam uma ligação polímero-partícula, o que aumenta a durabilidade do hidrogel. “Os hidrogéis podem ser pulverizados”, explica ele. “Eles criam uma barreira protetora contra chamas. Os proprietários poderiam aplicá-lo com um simples borrifador em suas residências”, acrescenta, lembrando que o aerogel é capaz de conter a combustão por pouco mais de sete minutos.
O pesquisador Matheus Costa Cichero, doutorando do Instituto de Química da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS) e professor do Instituto Federal Sul-Rio-Grandense (IFSul), compara a substituição da água presente na gelatina pelo ar , sem destruir e alterar o volume. “A evaporação da água deve ocorrer rapidamente para possibilitar a manutenção da estrutura porosa da sílica e não o seu colapso. Por isso, a necessidade de uma chama intensa como a usada no estudo, a 2.054°C”, diz sobre o fenômeno conhecido como aquecimento: como acontece quando a água entra em contato com uma panela quente.
Uso prático
A tecnologia desenvolvida deverá ser uma aliada diante da tendência crescente do número de incêndios em todo o mundo. A estimativa global é que esse tipo de ocorrência aumente 30% até 2050, segundo o último relatório do Programa Ambiental das Nações Unidas (ONU). No Brasil, mais de 170 mil incêndios foram registrados ao longo do ano, principalmente entre julho e setembro. O uso de substâncias que evitam a propagação do fogo varia de acordo com o produto, alertam especialistas. No caso do novo hidrogel criado pela equipe de Stanford, o objetivo é proteger edifícios. Questionado pelo Correio sobre a prevenção de incêndios em áreas naturais, Appel afirma que o hidrogel de sílica e celulose tal como está hoje não seria o mais adequado. Segundo ele, os retardantes podem ser classificados como “espumas para extinção de incêndios em curso, géis aplicados em estruturas antes do incêndio e retardantes de longa duração, que compreendem fosfatos ou outros compostos utilizados em áreas selvagens para extinguir chamas ou gerar barreiras protetoras”.
O engenheiro publicou outra pesquisa, voltada para a prevenção de incêndios em vegetação, em 2019. O material desenvolvido anteriormente já foi aprovado pelo Serviço Florestal dos Estados Unidos para conter chamas em ambientes naturais. Esse composto também tinha base de celulose, mas associada a outros componentes. Para Matheus Cichero, manter e aumentar a retenção de água e nutrientes no solo são outras formas de utilizar hidrogéis para preservar a vegetação. “Principalmente para períodos de seca como a que enfrentamos atualmente em regiões do Brasil e que acentuam os focos de incêndio.”
Brenno Silveira Neto, pesquisador da UnB, reforça que o estudo ainda está no início e precisa passar pela fase de escalonamento. Mesmo assim, ele elogia o potencial do uso do hidrogel. Silveira Neto, Appel e Cichero concordam que a questão do custo-benefício deve impactar, principalmente pelo baixo preço e pela alta disponibilidade tanto de sílica quanto de celulose para abastecer a indústria.
*Estagiário sob supervisão de Renata Giraldi
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